A técnica é velha mas comprovadamente eficaz: atiça-se o ódio da população contra um certo grupo, que passa a ser culpado, em lugar dos poderosos, dos males que afligem a sociedade, e promete-se ao povo que, uma vez eliminado ou «posto na ordem» este grupo, o futuro pode enfim começar.
Nem Adolf Hitler foi o primeiro político a ganhar eleições por este processo, nem José Sócrates será, se as vencer, o último.
Para atiçar este ódio não é preciso oferecer argumentos racionais. Os judeus podem ser apresentados como sub-humanos degenerados e ao mesmo tempo como intelectuais elitistas: presos por ter cão e presos por não ter, são igualmente dignos do opróbio público.
Os professores podem ser apresentados como selvagens que fazem greves e manifestações, e ao mesmo tempo como preguiçosos que gastam o tempo pago pelos contribuintes a ler livros e a fazer outras coisas inúteis, como estudar e ensinar.
Mas o grande crime, o crime imperdoável dos judeus e dos professores, é a resistência à mudança. Ousam, os miseráveis, atravessar-se no caminho dos heróis portadores do futuro, chamem-se eles Adolf Hitler ou José Sócrates.
Para as câmaras de gás com eles, já!
Blogue sobre livros, discos, revistas e tudo o mais de que me apeteça escrever...
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The aim of life is appreciation; there is no sense in not appreciating things; and there is no sense in having more of them if you have less appreciation of them.
..........................................................................................................Gilbert Keith Chesterton
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9 comentários:
Parece-me que ainda não vale tudo, colegas. Tal como me parece que há limites para hipérboles, analogias, metáforas e outras fintas literárias mais ou menos sinuosas, mais ou menos falaciosas. Sou professora e estou em luta. Mas de tudo aquilo que tenho lido sobre o processo de avaliação, (e já encontrei de tudo, desde o muito bom ao pouco lógico) nunca me tinha deparado com algo de tão mau gosto, pela desproporção, pela ignorância e pela leviandade.
Paula Rodrigues
O crime imperdoável dos judeus não foi, tal como o dos professores não é, a resistência à mudança. E não estou a entender a laracha das câmaras de gás.
É uma nova forma de humor?
Paula:
Como qualquer pessoa racional, dou-me conta das muitas diferenças que há entre Adolf Hitler e José Sócrates. Limitei-me apenas a chamar a atenção para duas semelhanças. A primeira é que ambos utilizam a técnica de demonizar grupos da população para ganhar votos. Isto não é hipérbole, analogia nem metáfora: é facto. A segunda é que ambos construíram uma imagem pública como «portadores do futuro», o que supostamente justifica que se trucide quem se lhes atravesse no caminho. Isto também é facto.
Se isto é mau gosto, não é mau gosto meu: é a realidade que é feia.
Anónimo:
O «crime imperdoável» dos judeus e dos professores não foi nem é, de facto, a «resistência à mudança». É apenas o crime de que foram e são injustamente acusados.
A referência às câmaras de gás não é laracha. É a aplicação, contra a concepção de escola deste governo, do argumento conhecido como «reductio ad absurdum» - porque de facto não estou a a ver como se pode aplicar uma política educativa contrária à concepção de escola da quase totalidade dos professores a não ser matando-os - mas desta vez, sim, em sentido figurado.
O post é até muito pertinente. Para desviar as atenções do que é realmente importante, como, por exemplo, do facto de alguns milhões de euros do dinheiro do contribuinte terem sido usados para salvar um banco gestor de fortunas (o dinheiro que não podia ser «desperdiçado» em maternidades, centros de saúde e escolas com poucos alunos, afinal pode ser «utilmente» aplicado a salvar fortunas...), para desviar as atenções desses factos, arranja-se uma diversão plausível: escolhe-se um grupo (são os professores, mas podiam ser as pessoas com menoss de 1,65m de altura, ou as que têm cabelo comprido), atiça-se a má vontade da opinião pública contra ele, nomeadamente acusando-se de usufruir de privilégios de que o comum não goza, insulta-se o dito grupo de forma sistemática, desumaniza-se... e depois mata-se neles. É dos livros.
Efectivamente! O que são as vidas de seis milhões de judeus? Menos que o comparável a alguns milhões de euros... Faz todo o sentido, a analogia. Sim, senhor!
Os professores portugueses já se comparam às vítimas do holocausto???
Se é trágico, não sei, mas cómico, é de certeza.
Caro JLS,
Já escreveu melhor.
"ambos utilizam a técnica de demonizar grupos da população para ganhar votos."
Os professores conseguiram isso sem necessidade se ninguém.
"A segunda é que ambos construíram uma imagem pública como «portadores do futuro»"
Não me recordo de ler algo como o que transcrevo abaixo, oriundo do seu próximo post, que melhor espelhe a concepção de escola pública como "portadores de futuro"
Segundo o JLS,
"A nossa escola é civilizadora. Na nossa escola, todos, mas mesmo todos, têm de ter acesso ao melhor que a nossa civilização tem para dar. Pode ser que a maioria não não queira chegar lá - mas todos têm que ter essa possibilidade. Na nossa escola, as Ciências, as Artes, as Letras, a Filosofia são um património irrenunciável de todos. A nossa escola está ao serviço da República. A nossa escola permite a formação de elites, mas, ao contrário da deles, não aprisiona as pessoas em castas."
.
Caro Range-o-Dente:
Se quer chamar «portadora do futuro» à escola que eu reivindico, tenha isto em conta: esta escola não fecha nenhum futuro a ninguém. Enquanto os Hitlers deste mundo, quando empunham o facho do futuro dizendo que nenhum outro é possível, estão de facto a fechar o futuro a toda a gente.
Caro Anónimo:
Tudo se pode comparar a tudo. As vítimas do Holocausto são um excelente termo de comparação porque no crime de que foram vítimas se vê com clareza o que noutros crimes menores é obscuro.
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