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The aim of life is appreciation; there is no sense in not appreciating things; and there is no sense in having more of them if you have less appreciation of them.


..........................................................................................................Gilbert Keith Chesterton
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quarta-feira, 30 de março de 2011

O país mais importante da Europa

Duas coisas me impressionaram com o chumbo do PEC 4: o serão televisivo que se seguiu, que foi um verdadeiro case study de como se monta uma campanha ideológica; e a inusitada veemência com que as instâncias europeias comentaram a votação. Os dois fenómenos estão ligados, como espero mostrar adiante.

O serão televisivo mobilizou todo o comentariado nacional em roda duma questão: E agora? Quem vai fazer o que tem que ser feito? Que "o que tem que ser feito" tem realmente que ser feito foi o pressuposto, apresentado como inquestionável, que uniu todos os comentadores, desde a extrema-direita neoliberal até à extrema esquerda (sendo que por "extrema esquerda" se deve entender, quando falamos de comentadores televisivos, o centro-direita). O discurso do "tem que ser" tinha que ser instalado, com exclusão de qualquer alternativa, nas poucas horas que se seguiram à votação; e foi fascinante assistir à rapidez e à precisão com que foi montado.

À volta deste tema gravitam vários subtemas. Um subtema explícito foi o do "arco governativo". Esta entidade misteriosa é constituída pelos partidos que podem, pela própria natureza das coisas, aspirar ao poder. Um outro subtema, desta vez implícito, foi o duma legitimidade "natural" que prevalece sobre a legitimidade democrática. Neste discurso os partidos de direita dispõem desta legitimidade intrínseca: advém-lhes de pertencerem ao dito "arco governativo", o que os obriga a serem "responsáveis" nas suas propostas. 

Se a legitimidade da direita está assim inscrita na ordem natural das coisas, então o sufrágio popular não serve senão para a confirmar. Ao invés: se o eleitorado for "irresponsável" ao ponto de conferir um qualquer mandato à esquerda, a legitimidade resultante deste mandato será sempre incompleta: ao pôr em causa o "tem que ser", a esquerda coloca-se por vontade própria fora do "arco governativo": torna-se, por definição, irrealista; e a sua autoridade, por democrática que seja, contra-natura.

Toda esta montagem pressupõe que "o que tem que ser" tem mesmo que ser. Se as vozes em contrário não podem ser desautorizadas, têm que ser silenciadas; e isto, na inexistência de mecanismos censórios suficientes, só pode ser conseguido se o "tem que ser" ocupar, na campanha eleitoral que se aproxima, todo o espaço do debate.

Naquele serão televisivo ninguém disse nada que os falcões do défice, aqui e na Alemanha, não gostassem de ouvir. Nunca se mencionou que alguns dos economistas mais conceituados do mundo têm declarado peremptoriamente que "o que tem que ser" não não tem que ser; e mais,  não só não tem que ser, como é um disparate contraproducente. O artigo de Paul Krugman no New York Times veio depois, é certo; mas não diz mais do que Krugman e muitos outros andam a dizer há três anos. Nem se mencionou que em Portugal muitos economistas independentes (ou seja, sem ligações profissionais ao sector financeiro) afirmam o mesmo. Nem que a rua anda a gritar a mesma coisa em Portugal, na Espanha, na Grécia, na Irlanda, no Reino Unido - e de resto a rua não tem, no consenso destes senhores, qualquer legitimidade democrática.

E eis que, num pequeno país no extremo Oeste da Europa, vem um parlamento eleito legitimar a rua. Aos olhos dos austeritaristas europeus, pouco interessa que alguns partidos tenham votado contra políticas de que discordavam enquanto outros votaram contra elas apesar de concordarem. Se o CDS teve a decência (ou a hipocrisia) de não declarar esta concordância; e se o PSD teve a franqueza (ou o impudor) de a declarar, isso é assunto interno nosso. Lá fora, um parlamento é um parlamento é um parlamento. Um deputado é um deputado é um deputado. E o parlamento português, os deputados portugueses, deram o seu aval oficial ao que a rua anda a gritar por toda a Europa. 

Não admira que Angela Merkel tenha tido o atrevimento de considerar a votação "lamentável" - dando assim um puxão de orelhas, perante o parlamento alemão, ao parlamento português. Nem que outros tenham ido além do "lamentável" para considerar a votação "uma tragédia". Compreenderam, melhor que os comentadores políticos portugueses, o alcance europeu do do voto português contra o PEC.

Sem intenção e sem se darem conta, Pedro Passos Coelho e o PSD levaram a que Portugal se tornasse, por algumas horas, o país mais importante da Europa. Do ponto de vista dos austeritaristas, pelas más razões; do ponto de vista de quem se lhes opõe, pelas boas.

quinta-feira, 24 de março de 2011

Um testemunho

Recebi o texto que se segue como comentário à minha mensagem anterior. Como não tem nada a ver com a mensagem, decidi eliminá-lo, o que vou fazer dentro de momentos. Mas como o julgo digno de ser lido, publico-o aqui, presumindo a autorização do seu autor.

É uma vergonha...
Em Évora existe um call-center que explora os jovens alentejanos, com contratos precários... há muitos anos... usando-se o sistema de rescindir com uma empresa e fazer contrato com outra.
Trabalhamos com todos os sistemas informáticos do grupo caixa seguros, Império Bonança, Fidelidade Mundial e Multicare, mas não temos o direito a receber um preço mais justo pelo nosso trabalho, tal como os funcionários das Companhias?
Quando contactamos os clientes das Companhias é como se fossemos funcionários destas Companhias, mas para recebermos ordenado já não nos identificamos como tal.
Limitamo-nos a receber entre € 400,00 a € 500,00 e somos tratados como máquinas, pior ainda… pois quando os computadores não funcionam, não existe remédio… quando estamos a precisar de ir à casa de banho, já temos tempos estipulados e a correr depressa.
O Call-center já funciona há muitos anos, muitas empresas passaram muitos “escravos” ficaram…
Agora que mudaram a gestão do Call Center, para uma empresa de escravatura dos tempos modernos, denominada Redware, do grupo Reditus, decidiram inaugurar… vejam lá… inaugurar o Call Center, que devia-se chamar Senzala.
Este grande acontecimento vai acontecer amanhã, dia 25 de Março, e vai ter direito à do Secretário de estado para a inovação Carlos Zorrinho, do Presidente da Câmara de Évora José Ernesto Ildefonso Leão de Oliveira, do Presidente da Caixa Geral de Depósitos Fernando Faria de Oliveira, do Presidente das Companhias de Seguros do Grupo Caixa Seguros Jorge Magalhães Correia e as suas comitivas.
E pergunto-me vão inaugurar o quê, mais uma fase da exploração de pessoas, que têm que se sujeitar às condições destes empregos porque não existe mais nada?
Mas não somos pessoas?
Não devíamos ter direito a usufruir de condições mais justas pelo nosso trabalho, para termos direito a viver?
Até quando é que o nosso Pai, a nossa Mãe, o nosso Tio, a nossa Tia,… poderão ajudar-nos?
Mas depois é ver a publicidade destas empresas, em que parecem todos bons rapazes e muito solidários, eis um exemplo http://www.gentecomideias.com.pt/gentecomideias/Pages/MensagemdoPresidente.aspx
Sr. Presidente da Câmara, tenha vergonha em pactuar com esta forma de escravatura… ponha a mão na sua consciência, isto se ainda a tiver…

Publicado no meu outro blog: um rascunho à disposição de todos

European Declaration of Sovereignty

Popular Sovereignty defines democratic polities and applies to every Member State of the European Union: in Substance if not in Form, as in those States that are Constitutional Monarchies; and as a matter of Right if not always, or fully, of Fact.

However, the Principle of Popular Sovereignty fails to apply to the European Union, either in Substance or in Form; nor does it apply either as a matter of Right or of Fact. The European Union is thus a Polity that lacks a legitimate Sovereign.

When the sovereign citizens of the Member States are required to cede increasingly large parcels of their Sovereignty to the Union, such parcels do not devolve on an equally legitimate European Sovereign; nor are they shared, as alleged, with the Peoples of other States, since no State’s electorate is represented in the democratically elected Institutions of any other State.

Sovereignty devolves, instead, on lobbies, technocracies, bureaucracies or, at best, on political institutions so far removed from the original sources of their legitimacy as to become, for any practical purposes, illegitimate. This inchoate, anonymous and unnamed pseudo-Sovereign is free to impose its Treaties, Laws and Directives upon each citizen of each Member State; to deliberately cloak these Treaties, Laws and Directives in such opaque language as to render them incomprehensible even to highly educated and well-informed Europeans; and, worst of all, to impose them on each Member State, by means that circumvent and defraud the known or presumed will of the Sovereign.

In so doing, the present leaders of the Union betray the original purpose of its Founding Fathers. Prosperous and decent societies seem increasingly out of reach; and even the avoidance of War on European ground appears increasingly uncertain.

The preceding considered:

We, the Peoples and the People of the Union, constitute Ourselves Sovereign over Our common Polity, as We already are over each Member State;

We remind Our elected officials that their powers are exercised in Our name, and not in anyone else’s;

We demand the establishment of such Institutions as are needed for the good and legitimate governance of the Union, namely:

A full-powered Legislative Branch consisting of two Chambers, through which the Peoples and the People of the European Union can exercise their Right to adequate Representation;

An Executive Branch accountable to the Legislative;

And a proper Judicial Branch with the full powers and competencies attendant to a democratic Polity.

We remind the Union’s non-elected officials of their non-elected status; the Common Good which they serve is defined and determined by the Sovereign through its elected bodies; any professional, scientific or theoretical authority which Our Public Servants bring to their functions is to be used in the pursuit of the Common Good as a political given, not in its definition or determination.

Namely, the Economic Governance of the Union shall pursue the Common Good as defined by the Sovereign. Macroeconomic considerations are to be regarded as a means to this end, and not as ends in themselves. Much less shall a single macroeconomic criterion, such as the control of inflation, be isolated from the others and regarded as the sole purpose of all economic governance. Human Laws govern matters of Right, not of Fact; no scientific or theoretical proposition, however contested or uncontested, shall be subject, to its detriment or benefice, to any form of legal or constitutional validation. This prohibition applies to Economics as much as to any other branch of Knowledge.

We declare null and void, and denounce as usurpations, all Treaties, Laws and Directives, as well as any isolated clauses thereof, that violate the Spirit or the Letter of this DECLARATION, defy the Sovereignty of the People, or seem designed to circumvent, defraud or thwart the Will of the Sovereign; and announce Our determination to fight and disobey, either individually or collectively, any such norms.

The Signataries,

sábado, 12 de março de 2011

Não vai dar em nada? Vai, sim senhor

E quem confirma , sem saber, o que afirmo no título são alguns ddos ilustres comentadores da nossa praça. Pedro Norton anda tão à rasca com a Geração à rasca que escreveu dois artigos em edições consecutivas da Sábado: um a "provar" que a "geração à rasca" é constituída, afinal, por neoliberais qui se ignorent , e protestam contra os "privilégios" dos pais - como se receber 14 vezes por ano, com um mínimo de estabilidade, um ordenado equivalente a 0,025% do que aufere o sr. António Mexia fosse um privilégio intolerável e nele residisse a verdadeira causa de os jovens estarem à rasca.O sr António Mexia não tem nada a ver com este assunto: como ele próprio declarou, muito irritado, a um jornalista de televisão, "a competência paga-se."

No segundo artigo, o sr. Norton insiste na mesma tecla. Os jovens estão zangados com a narrativa social-democrática que funcionou para os pais mas não funciona para eles. Sem argumentos, o sr Norton recorre à caricatura: A aspiração legítima a um trabalho estável  transforma-se na boca de Norton na cobiça egoiosta dum "emprego para a vida"; qualquer direito que se negoceie e conquiste é um privilégio que se "abocanha" (sim, foi esta a palavra utilizada).

Sr Norton, não precisa de ter medo dos manifestantes, por muitos que sejam, que nunca acreditaram em si. Estes estão apenas muito zangados. Mas tenha muito medo daqueles que acreditaram na sua narrativa, porque estes, embora possam ser poucos, estão completamente furiosos.

Há também a teoria da manipulação, que algumas personalidades ligadas ao PS chegaram a aventar timidamente para se calarem logo a seguir. Manipulados? Manipulados por quem? Pelo sr. Norton? Depressa se viu que este velho argumento desta vez não pegava.

Miguel de Sousa Tavares mandou umas bocas de que depois pediu umas desculpas bastante chochas. Passemos adiante.

Resta o Professor Marcelo. Resta sempre o Professor Marcelo. Gosto muito de o ouvir porque confirma frequentemente a minha antiga opinião que certas formas de estupidez requerem muita inteligência. E foi dele, sem dúvida, o comentário mais estúpido que se fez à manifestação: que se tratava da mensagem errada para enviar à sra. Merkel.

O Professor Marcelo não anda neste mundo. Ainda não percebeu o sarilho em que estamos metidos, nós e toda a Europa. Não percebeu ainda que cada vez mais europeus vêm os políticos e os financeiros como a parte maior do problema. Professor Marcelo: Muita sorte teremos nós, os europeus, se num dia destes ou num ano destes não tivermos que decapitar alguma Maria Antonieta. Preocupe-se com os pescoços das Marias Antonietas e não com os ouvidos virginais da sra. Merkel, que já devem ter ouvido pior e vão ouvir muito pior nos tempos mais próximos.

E se ela se ofender, paciência: não digo que o professor não ficasse bem no papel de Scarlett O'Hara, mas acho que a geração à rasca está em posição de lhe dizer Frankly, my dear, we don't give a damn.