1. Abolir ou reduzir drasticamente o Ministério da Educação:
O Ministério segrega burocracia como o fígado segrega bílis. Ao multiplicar-se em dependências centrais e regionais, comporta-se como um tumor que produz metástases e acaba por matar o organismo hospedeiro. Pelo simples facto de existir, dá origem à ideia falsa e perniciosa que o Estado ensina os alunos, sendo os professores simples agentes desta actividade (agentes de ensino, como se diz em «eduquês»). Ora os professores não são agentes, são autores: privados da autoridade que lhes é própria e natural, não podem ensinar. Acresce que a enorme burocracia do Ministério e das suas dependências absorve recursos financeiros que fazem falta nas salas de aula.
2. Revogar a Pedagogia de Estado actualmente em vigor:
Nenhuma doutrina pedagógica está cabalmente validada por qualquer critério científico. Não há nenhuma maneira de ensinar ou de educar que seja, demonstravelmente, «pedagogicamente correcta» ou «pedagogicamente incorrecta». Em matéria de ensino e educação, «correcto» é o que funciona caso a caso para uma dada escola, uma dada turma, um dado aluno ou um dado professor. Além dos professores individuais, só as instâncias de validação deontológica e científica que eles possam organizar têm autoridade para determinar o que é ou não é «correcto». O Estado não tem esta autoridade: o sufrágio popular confere aos eleitos legitimidade democrática, mas não lhes confere, nem autoridade científica, nem o poder exclusivo e irrestrito de determinar o bem comum. A existência duma Pedagogia de Estado é uma usurpação de autoridade e um abuso de poder.
3. Permitir a formação de instâncias autónomas de validação profissional:
Estas instâncias terão autoridade científica, deontológica e disciplinar, e deverão ser independentes do poder político ou económico.
4. Reformular os currículos:
O Currículo Nacional, a existir, deve contemplar apenas os conhecimentos estruturantes e contextualizantes (a Língua Materna, a Matemática, uma ou várias Línguas Estrangeiras, a História, a Geografia, as Ciências Naturais, a Filosofia, a Gramática, o Pensamento Crítico, a Literatura, a Música, as Artes, a Geografia e o Desporto). As disciplinas «qualificantes» de banda estreita devem ser adoptadas escola a escola em função das suas circunstâncias.
5. Reduzir a carga horária semanal dos alunos e o tempo que passam na escola:
A frequência da escola não pode ter o horário dum emprego em full-time. Sobrecarregar os alunos, tirar-lhes todo o tempo livre, privá-los da sua infância, da sua adolescência, das suas brincadeiras e das suas formas espontâneas de socialização, tudo isto para que os pais (e mais tarde, em grau ainda maior, eles próprios) possam ser tratados como escravos nos empregos, é um crime duplamente hediondo.
6. Encontrar o justo equilíbrio entre a inovação e as práticas testadas:
A inovação não é um fim em si mesma, não pode ser imposta, e é sempre um subproduto: acontece naturalmente quando alguém procura fazer melhor. O que interessa não é se uma técnica é tradicional ou inovadora, mas sim se funciona ou não. Se os ditados, as cópias, as traduções e retroversões, a memorização de factos ou tabelas, a recitação de cor de poemas funcionarem para determinados alunos ou para determinados professores, não há razão nenhuma para que não sejam utilizados.
7. Privilegiar a relação professor-aluno:
Onde houver um professor e um aluno, mesmo no meio do deserto, há uma escola. Tudo o resto é incidental, acessório e instrumental. A escola não é uma circunferência e portanto não tem um centro: é uma elipse e tem dois focos.
8. Subordinar a escola e o sistema de ensino aos direitos básicos dos alunos enquanto alunos e dos professores enquanto professores:
O principal direito e o principal dever do professor é ensinar. O principal direito e o principal dever do aluno é aprender. Todos os normativos a que uns e outros estejam sujeitos devem ter nestes direitos e nestes deveres o seu fundamento. Quaisquer normativos que limitem estes direitos ou absolvam destes deveres são ilegítimos, subvertem a escola e devem ser eliminados. Estes direitos devem ser, não só reconhecidos e respeitados, como protegidos, se necessário, contra os próprios alunos e os próprios professores, e por maioria de razão contra terceiros.
9. Encarar as tecnologias como um meio e não como um fim:
O teorema de Pitágoras tanto se ensina e aprende riscando o chão com um pau como fazendo uma apresentação em Powerpoint.
10. Não perder de vista as condições materiais:
As escolas têm de estar sempre limpas e em bom estado de conservação, e têm que ser aquecidas no Inverno: deve-se poder andar lá descalço. Não basta comprar equipamentos, é preciso (embora renda menos votos) fazer a sua manutenção. Assegurar as melhores condições materiais possíveis não deve ser a principal função das autoridades educativas exteriores à escola: deve ser a única.
11. Assegurar a paz e o civismo:
A segurança de alunos e professores prevalece sobre a escola inclusiva: doutro modo, na ânsia de incluir os piores, acabamos por expulsar os melhores. Se um único aluno tiver medo de ir à escola, a escola fracassou e o melhor é fechar.
12. Autorizar os professores:
Os professores têm sido responsabilizados por tudo o que se passa na escola e fora dela. No que toca o que se passa fora da escola, é responsabilidade a mais. No que toca o que se passa dentro dela, a sua responsabilidade terá de ser acompanhada da autoridade concomitante, caso contrário tanto a autoridade como a responsabilidade serão puro espectáculo.
12. Responsabilizar os alunos:
Não há aprendizagem sem esforço: esse esforço deve ser premiado e a sua ausência punida. O aluno que, por actos de indisciplina, boicote o esforço de aprendizagem dos seus colegas deve ser penalizado, uma vez que os está a lesar num direito fundamental. O delinquente tem direito a ser apoiado, mas o apoio vem depois: primeiro, é preciso proteger os outros.
13. Responsabilizar os pais:
Pela mesma razão que não se pode dar aos professores responsabilidade sem autoridade, também não se pode dar aos pais autoridade sem responsabilidade. Compete aos pais educar os filhos para a Escola. O trabalho não é desculpa: há valores mais altos que o trabalho, e um deles é a educação dos filhos. Outro, é o dever moral que cada um de nós tem de não se deixar escravizar. Quando um aluno falta ou é indisciplinado, os pais devem sofrer consequências que poderão ir, conforme a gravidade dos casos, de coimas ligeiras até penas de prisão, como se faz em toda a Europa.
14. Orientar os alunos à entrada do Secundário com base no percurso escolar:
Para um aluno se matricular num curso do Ensino Secundário orientado para prosseguimento de estudos teria de ter concluído o 3º Ciclo do Básico na idade própria e com resultados superiores à média. Concomitantemente, não se poderia matricular em nenhuma disciplina que não fosse de iniciação sem ter passado um exame nacional em que demonstrasse estar em condições de a frequentar.
15. Dar liberdade aos pais para escolher a escola dos seus filhos e às escolas para escolher o seu corpo docente.16. Integrar a avaliação formativa dos professores na avaliação das escolas, dos alunos e do sistema educativo:
Qualquer avaliação teria em conta, tanto as causas endógenas como as exógenas dos bons ou maus resultados apurados, de modo a que nenhum professor fosse prejudicado na sua avaliação por trabalhar numa má escola, nenhuma escola fosse prejudicada por ter alunos problemáticos e nenhum aluno fosse prejudicado, em provas nacionais, por ter tido maus professores; e que nenhum aluno, professor ou escola fosse penalizado pelos vícios do sistema.
17. Identificar as escolas mais difíceis e pagar melhor aos professores que trabalhassem nelas.
18. Fazer depender a progressão nas carreiras, não da avaliação formativa referida no ponto 16, mas duma avaliação sumativa cujas duas únicas vertentes seriam a apreciação do currículo e a prestação de provas públicas:
A apreciação curricular teria como objectivo avaliar a competência pedagógica do professor e os resultados obtidos pelos seus alunos, tendo em conta as condições favoráveis ou adversas em que estes resultados fossem obtidos. Não haveria cotas para as classificações resultantes desta avaliação. Não haveria cotas, a nível de escola, para os diferentes escalões. Poderia haver cotas para os escalões a nível nacional ou regional. Deste modo, ao recrutar professores de proveniências diversas, cada escola teria mais um elemento para os comparar entre si.
Blogue sobre livros, discos, revistas e tudo o mais de que me apeteça escrever...
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5 comentários:
Por mim já chegava.
Abraço.
Há uns tempos, saiu no Público uma crónica de Desidério Murcho (http://dererummundi.blogspot.com/2008/07/ministrio-da-propaganda.html) com o título "Ministério da Propaganda". Partia da constatação de há algumas décadas ser comum a existência de ministérios da propagada, coisa hoje em dia impensável. (Por acaso, continuam a existir com outros nomes, tais como assessores de imprensa e central de comunicações.) Mas que o conceito dum ministério com esse fim seria ridículo, tanto quanto o é existir actualmente um ministério da educação.
Do ponto de vista do conhecimento, claro que um ministério da educação não faz sentido. Que legitimidade tem um estado para determinar o que é o conhecimento oficial? Compreendo e aceito que existam lotes de conhecimento que se possam considerar basilares. Mas a actual acção do estado vai muito mais além, determinando ao ínfimo detalhe a vida escolar dos alunos. O estado não tem que definir conteúdos programáticos. Basta que certifique, quem assim o desejar, que forma aprendidos.
Mas a questão do estado na educação não é a do saber mas sim a do poder. Uma teia burocrática emana do ministério e com ela uma rede de pessoas mantém-se colada ao seu poder. Tanto se tem falado na autonomia das escolas mas depois vamos ver os pormenores e lá está o ME a tudo determinar.
Acabar com certos ministérios, como o da educação ou o da economia, seria aceitar que as pessoas são capazes de se organizarem sem a existência dum estado-paizinho. Seria aceitar que as escolas são capazes de ensinar sem a supervisão do ME e que as empresas sabem fazer negócios sem que o estado as tutele.
No entanto, sem estes ministérios fica o estado menos forte, logo serão menos poderosas as pessoas que o comandam em determinado momento. Ministério da Educação? Não, Ministério do Poder.
Gostei.
Só acrescentaria uma: Orientar, obrigatoriamente, os alunos à entrada do Secundário, com base no percurso escolar.
Obrigado pela sua sugestão, Daniel. Como pude não me lembrar disso?
Olá, Sarmento!
Gostei de ler seu blog. Também sou professora e gosto de trocar experiência sobre educação com outros colegas.
Li a sua lista de como melhorar a educação. Vejo que meu país e o seu tem mesmo muitos pontos em comum, além da relação histórica de colonização.
Abraços e parabéns pelo blog!
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