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The aim of life is appreciation; there is no sense in not appreciating things; and there is no sense in having more of them if you have less appreciation of them.


..........................................................................................................Gilbert Keith Chesterton
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segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

«How much is enough?»

Estamos a ser governados por gente que sabe tudo de Economia excepto para o que ela serve. Assim se compreende que apresentem como 'sucessos' o que na realidade são fracassos - diminuição dos salários e dos rendimentos, precariedade económica, desigualdades extremas. 

Robert e Edward Skidelsky rejeitam a noção de que a Economia é a 'ciência da escassez'. Cito e traduzo:

Talvez o principal obstáculo ao 'bom viver' para todos seja a disciplina de Economia, ou melhor, a ortodoxia mortífera que navega sob este nome na maioria das universidades do mundo. A Economia, segundo um texto recente, estuda 'como as pessoas escolhem usar recursos limitados ou escassos na tentativa de satisfazer os seus desejos ilimitados'. Os adjectivos destacados são estritamente redundantes: se os desejos são ilimitados, os recursos são por definição limitados em relação a eles, por mais ricos que sejamos em termos absolutos. Estamos condenados à penúria, não por falta de recursos, mas pela extravagância dos nossos apetites.

A Economia não serve para adaptar a realidade a um modelo ideal, por mais sedutor que ele seja para o intelecto; nem serve para satisfazer os desejos (esses, sim, ilimitados) duma oligarquia ultra-minoritária. Serve para 'estudar os requisitos materiais do bem-estar' (Alfred Marshall) e assim assegurar o bem-estar material do maior número possível de seres humanos; e para manter a civilização (conceito este que os tecnocratas desconhecem ou desdenham) ao nível mais alto que esses requisitos materiais permitam. A Economia é de origem, e urge que continue a sê-lo, um ramo da filosofia moral.

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Não é a propriedade privada, estúpido, é a propriedade corporativa!

Gosto da distinção que Vítor Lima faz entre empresas públicas e empresas estatais. Ajuda a desmontar a dicotomia que os neoliberais fazem entre propriedade privada e propriedade estatal. Propriedade pública é tudo aquilo que é propriedade da Sociedade Civil, independentemente de ser ou não administrado pelo Estado. Só uma forte esfera pública - uma "res publica" - permite refrear e contrabalançar a corrupção "tendencial" dos políticos profissionais (expressão esta que seria, de resto, um oxímoro numa "res publica" saudável).

Por outro lado, não compreendo a propriedade privada noutro contexto que não seja o das pessoas naturais, eventualmente associadas em grupos mas individualmente identificáveis nesses grupos. O liberalismo ortodoxo defende a propriedade corporativa como se fosse privada, mas é evidente que a propriedade corporativa não só não é privada, como se situa no pólo oposto da privada. Uma sociedade anónima de responsabilidade limitada é uma pessoa jurídica e não uma pessoa natural. Os seus direitos são legais ou contratuais, não são naturais; e por isso mesmo podem ser revogados a qualquer momento pelos povos soberanos.

Por alguma razão Adam Smith se opunha em princípio a este tipo de empresas. Só admitia a sua existência em caso de absoluta e reconhecida necessidade, e mesmo assim na dependência de estatutos outorgados pela autoridade pública. Ao defender a propriedade privada como direito natural (e não vou complicar aqui o meu argumento discutindo se ele tinha ou não razão neste ponto), Smith nunca pretendeu que este direito prevalecesse sobre outros direitos naturais; e tinha em mente, como titulares deste direito, as pessoas naturais que exemplifica com o seu cervejeiro, o seu padeiro e o seu talhante.

No mundo actual, o direito à propriedade privada é talvez o mais invocado e o menos exercido. No que toca os meios de produção, é hoje praticamente residual. O padeiro e o carniceiro de Adam Smith já não existem a não ser, talvez, e com enormes dificuldades, nalguns cantos remotos do planeta como o Afeganistão ou a Somália. É pelo menos irónico que a propriedade privada propriamente dita tenha sido praticamente abolida no mundo moderno, não pelo comunismo ou pelo socialismo, mas pelo capitalismo no seu processo de financeirização.

«Corporations Are Not People!» Este grito de guerra do movimento Occupy Wall Street, nascido em contestação à decisão «Citizens United» do Supremo Tribunal dos Estados Unidos, adquire assim uma abrangência e uma relevância para as lutas das esquerdas em todo o mundo que talvez nem os seus próprios autores tivessem previsto. E quando um Mitt Romney em campanha eleitoral respondeu a alguém que o interpelava com a frase «but corporations ARE people, my friend» pode ter dado mais um sinal da incapacidade de ler os sinais dos tempos que lhe valeu a derrota.

Não há qualquer contradição, antes pelo contrário, entre respeitar a propriedade privada e lutar contra a propriedade corporativa hegemónica, que anula todos os direitos naturais e políticos das pessoas naturais e torna possível o feudalismo financeiro que (ainda) dá pelo nome de Capitalismo.

sábado, 8 de dezembro de 2012

O Poder corrompe os humanos, mas o mercado corrompe a condição humana

As sociedades humanas são inevitavelmente corruptas. Em maior ou menos grau, mas geralmente dentro dos limites do tolerável - porque, se estes forem ultrapassados, a organização social existente não poderá sobreviver e será substituída por outra.

A novidade do capitalismo tardio foi substituir a dicotomia «Propriedade Pública / Propriedade Privada» pela dicotomia «Propriedade Privada / Propriedade Corporativa», em que o espaço público desapareceu, o espaço privado se tornou residual e a propriedade corporativa ocupa a quase totalidade do espaço e do tempo da vida, mercantilizando-os em todas as suas componentes.

As sociedades actuais não são só inevitavelmente corruptas: são inerentemente corruptas, porque o seu fundamento é a mercantilização do poder. E quando falo de poder refiro-me tanto ao poder político como ao poder de cada um sobre si próprio. O mercado livre é, assim, a marca duma nova condição humana em que só se pode ser livre no mercado, pelo mercado e para o mercado.