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The aim of life is appreciation; there is no sense in not appreciating things; and there is no sense in having more of them if you have less appreciation of them.


..........................................................................................................Gilbert Keith Chesterton
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domingo, 31 de maio de 2020

Why Brownlee Left


Why Brownlee left, and where he went,
Is a mystery even now.
For if a man should have been content
It was him; two acres of barley,
One of potatoes, four bullocks,
A milker, a slated farmhouse.
He was last seen going out to plough
On a March morning, bright and early.

By noon Brownlee was famous;
They had found all abandoned, with
The last rig unbroken, his pair of black
Horses, like man and wife,
Shifting their weight from foot to
Foot, and gazing into the future.

sexta-feira, 29 de maio de 2020

David Graeber, 'Debt: The First 5,000 Years'

Se há uma pergunta na ciência económica para a qual toda a gente pensa que tem uma resposta óbvia, é esta: "O que é o dinheiro?" E quanto menos sabemos o que é o dinheiro mais pensamos que sabemos. Quem sabe, porém, sabe sobretudo que não sabe. A natureza do "dinheiro" (como a de "riqueza", que não é a mesma) é uma das questões mais intratáveis e complexas no debate entre economistas; e já esteve na raiz de não poucas guerras, e das mais mortíferas.

Há hipóteses mais plausíveis do que outras. Uma delas, bastante consensual, é que a definição de "dinheiro" está ligada à de "dívida." Isto, numa primeira abordagem, parece óbvio: se forneço a alguém um bem ou serviço e recebo em troca um papel que não serve para nada a não ser para obter outro bem ou serviço, então o que tenho em meu poder não é em si mesmo riqueza, mas apenas o título de uma dívida em que estou na posição de credor.

Mas não há consenso sobre todos os eixos de articulação entre o dinheiro e a dívida. Pior: também não há consenso sobre uma definição exacta de "dívida" nem sobre uma definição exacta de "riqueza." Sabemos que as três noções não são sinónimas, presumimos fundamentadamente que estão ligadas, mas não sabemos exactamente como estão ligadas.

Para discutir estas matérias, David Graeber recua 5.000 anos até à Idade do Bronze e viaja por toda a Terra, examinando as mais diversas formas de organização social e económica que os historiadores, os sociólogos e os antropólogos têm estudado. E centra-se na noção de "dívida", provavelmente aquela que se presta a uma definição mais plausível. "Dívida" será então a obrigação - moral, religiosa, legal, ritual - de compensar um benefício recebido mediante uma contrapartida. Sendo que nem o benefício nem a contrapartida são necessariamente objectivos ou facilmente quantificáveis.

Juntamente com mais duas ou três obras canónicas (não serão muitas mais), 'Debt' obriga-nos a pensar por fora das vulgatas cássica e marxista sem por isso termos que renunciar ao que há de mais frutífero nas respectivas teorias. E obriga-nos a dar pelo menos o benefício da dúvida às tão negligenciadas abordagens anarquistas da economia, da sociologia e da história.

Da última vez que procurei, este livro não tinha sido editado em português. Havia outros do mesmo autor, porventura menos importantes; fica a hipótese de os editores portugueses se terem assustado com a extensão do texto. Entretanto pode ser que já tenha sido publicada uma tradução em português. É uma leitura que se recomenda, quando mais não seja para evitarmos pronunciamentos taxativos sobre noções como dívida privada e dívida pública e sobre as implicações políticas e estratégicas do que sabemos, ou julgamos saber, sobre a matéria.

terça-feira, 26 de maio de 2020

Aldous Huxley, Point Counter Point

Quando participei num desafio em que era convidado a publicar no Facebook as capas de dez livros que me tivessem marcado, um dos títulos em que pensei foi 'Nineteen Eighty-Four' de George Orwell. E como este livro é frequentemente emparelhado com a distopia de Aldous Huxley 'Brave New World', pensei em incluir este título na lista.

Não o fiz, porém. É certo que Nineteen Eighty-Four' me marcou, é igualmente certo que 'Brave New World' também, e que a conjunção ou oposição das duas distopias me marcaram ainda mais. Nenhuma das duas me serviu de grelha de leitura única para compreender o meu tempo porque - lá está -existia também a outra.

Mas a obra mais ambiciosa de Huxley é 'Point Counter Point', e marcou-me mais do que me pareceu à primeira leitura. O romance foi publicado em 1928 e grande parte das suas personagens podem ter sido inspiradas em contemporâneos de Huxley. O mundo em que a acção decorre é o das elites artísticas, jornalísticas, literárias e científicas da época. E políticas, também: o líder fascista Edward Webley chefia um movimento que é, na Europa dos finais dos anos Vinte, perfeitamente respeitável.

Porquê falar deste romance e não de outro mais imediatamente relevante - como 'Brave New World' - para as perplexidades da era em que vivemos hoje? Em parte porque os pares de opostos que determinam a organização do texto - natureza e artifício, racionalidade e intuição, espectáculo e acção, ponto e contraponto - continuam a ser úteis para podemos ler o nosso tempo. Mas principalmente porque se trata, não de um panfleto nem de um 'roman à clef', mas de literatura. O autor não ignora a economia, a política ou a história - se as ignorasse nem literatura seria capaz de fazer - e não se abstém, longe disso, de produzir crítica social. Produz esta crítica de um ponto de vista que não é o do seu contemporâneo D.H. Lawrence; mas, ao retratar Lawrence na personagem Mark Rampion, e dando-lhe amplamente voz, cria o contraponto crítico para o seu ponto. Já é obra de monta.

sexta-feira, 22 de maio de 2020

Contos de Grimm: Edição Completa

As edições habituais dos contos de Grimm, como as dos contos de Andersen, obedecem a escolhas. Um dos critérios é desde logo a presumida adequação a um público infantil, outro será a purga do que neles houver de mais cruel, outro a preocupação de evitar repetições e redundâncias. Mas são precisamente as repetições e as redundâncias que fazem a riqueza da obra completa (que foi sendo construída, ao longo de sucessivas edições, durante várias décadas).

Há personagens recorrentes: o rei, a rainha, o "filho de rei", a "filha de rei", os três irmãos, as três irmãs, a madrasta (mas não o padrasto), a bruxa, o alfaiate, o sapateiro, o moleiro, o soldado demobilizado (mas não o no activo), o mestre e o aprendiz, o Diabo, S. Pedro (mas não os outros santos). Fadas há poucas: na Gata Borralheira não é  uma fada madrinha que calça e veste a protagonista, mas sim uma ave; e esta vive na árvore que ela plantou junto à campa da mãe.

Há cenários recorrentes: palácio e floresta, cidade e campo. E nomes recorrentes: Branca de Neve (Schneewittchen, em dialecto, que é a da história mais conhecida, e outra, Schneeweisschen, noutra história). Há um tempo recorrente, que é o do mito: o tempo em que "desejar ainda servia de alguma coisa", o tempo em que "todos os sons tinham sentido e significado."

A repetição, a recorrência, as variações sobre uns poucos temas criam escalas harmónicas: o significado conjunto é maior que a soma dos significados parciais. Quem quiser entender a Alemanha e os alemães tem aqui uma ajuda. 

quarta-feira, 20 de maio de 2020

Álvaro Cunhal, Tradutor de Shakespeare



Não falta reflexão política em Shakespeare. Stephen Greenblatt, em "Tyrant", elabora mesmo uma taxinomia do despotismo na sua obra: Ricardo III é capaz de qualquer fraude ou crime para chegar ao poder mas não sabe o que fazer dele depois de o alcançar. Leontes enlouquece e exerce o poder como um psicopata, crescendo em crueldade no decorrer da acção. Coriolano, um aristocrata cujo desdém pela plebe o torna incapaz de se sujeitar aos contrangimentos duma campanha política, torna-se um traidor. Macbeth, roído pelo remorso, vê ameaças e conspirações em tudo excepto naquilo que acaba por vencê-lo. No ciclo Henrique VI, o populista John Cage convoca as massas rurais contra as elites letradas e enforca quem sabe ler.

Porque escolhe então Álvaro Cunhal o "Rei Lear" para a sua única tradução de Shakespeare? Lear não é tão obviamente um tirano como o são as filhas Goneril e Regan; a máquina inexorável da tragédia, que põe em marcha, não tem a marca da vontade de poder mas sim a de se despojar dele. Mas Lear acaba por ser tanto mais protagonista da Tragédia e da História quanto menos se quer protagonista duma vontade política.

Escreve Cunhal na sua nota introdutória que o Rei Lear é o admirável exemplo da obra de um grande artista assente no espírito criador do seu povo, da fusão do génio individual com o génio popular. Mas para estabelecer o nexo entre o génio do indivíduo e o espírito criador do povo, para mostrar como se opera esta fusão, Cunhal não se pode ficar por uma mensagem política superficial. A sua abordagem tem que ser a de um erudito e a de um poeta.

O erudito segue as raízes de Lear na tradição popular e literária que antecede o texto de Shakespeare; compara as diferentes versões e edições de modo a chegar à mais idónea; data o período em que foi escrito (entre 1603 e 1606); interpreta-o no contexto cultural da sua época; e refere mesmo, caracterizando-as, algumas das deturpações, falsificações, "emendas" e "aperfeiçoamentos" que outros autores menos talentosos lhe introduziram entre a segunda metade do século XVII e o final do século XVIII. Todo este trabalho aparece documentado nas notas finais.

O poeta faz esta coisa espantosa: apresenta-nos um texto que poderia, aos olhos de qualquer leitor, ter sido escrito originalmente em português. E isto sem nunca o trair.