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The aim of life is appreciation; there is no sense in not appreciating things; and there is no sense in having more of them if you have less appreciation of them.


..........................................................................................................Gilbert Keith Chesterton
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domingo, 30 de agosto de 2009

Votar PS? Como poderia eu, em consciência?

Há décadas que somos governados por uma pequena clique - umas centenas, no máximo uns poucos milhares de pessoas - que se vai revezando nos órgãos de soberania, na banca, na comunicação social, na alta burocracia, na construção civil, nos grandes escritórios de advogados e no futebol. Esta clique está representada politicamente, num jogo permanente de rivalidades e alianças, pelos dois partidos do Bloco Central dos Interesses: o PSD e o PS (e muito residualmente por um ou outro nome do CDS/PP).

Isto justificaria por si só, para qualquer cidadão a quem incomode sentir no pescoço a pata alheia, a recusa liminar de votar em qualquer destes partidos.

Não obstante, quero entregar-me agora, num exercício lúdico de pura especulação, à discussão das condições em que poderia, como homem da esquerda democrática, votar PS.

Imaginemos, por exemplo, que o PS se comprometia, com objectivos quantificados e com a competente calendarização, a reduzir substancialmente os falsos recibos verdes. Seria louvável; mas como poderia eu acreditar na sinceridade deste compromisso quando a própria Administração Pública se obstina em dar o mau exemplo? Ou que se comprometia, mais uma vez com números e com prazos, a reforçar significativamente os poderes e os meios da Inspecção do Trabalho: como poderia eu confiar nisto, quando este organismo comete ele próprio as ilegalidades que lhe compete combater?

Suponhamos ainda que o próximo governo se comprometia a deixar em paz a "educação" e se propunha melhorar o ensino; que se comprometia a medir o êxito desta política pelo que os alunos efectivamente aprendessem e não pela manipulação de estatísticas; que ouvia a voz e aceitava a ajuda dos professores, muitos dos quais estão disponíveis, para melhorar o nível cultural dos portugueses, em vez de transformar em inimigos aliados que seriam preciosos para levar a bom termo essa política. Que foi feito da confiança recíproca que isto pressupõe?

Ou que diminuía substancialmente as custas judiciais de modo a que os litígios não estivessem ganhos à partida pelos mais ricos; ou que confiava a acção legislativa ao Parlamento, que é quem tem legitimidade para ela, em vez de encomendar as leis a escritórios de advogados que as cozinham em seu próprio benefício; que apresentava um plano calendarizado, claro e credível para combater a litigação fútil ou abusiva, especialmente por parte do próprio Estado, que litiga à borla. Alguém acredita que os dirigentes e os candidatos do PSD/PS são santos, dispostos a sacrificar pelo bem da República os seus próprios rendimentos, poder e estatuto?

Ah, mas há a governabilidade. Ah, mas há o perigo de a direita subir ao poder. É o que dizem os propagandistas do PS. Sobre a chantagem da governabilidade, estamos conversados: nenhum governo, por mais maioritário que seja, por mais que esteja aliado à oligarquia, consegue governar por muito tempo contra a sociedade civil. Este que agora termina o mandato é prova disto. Em contrapartida, qualquer governo que tenha do seu lado a sociedade civil consegue governar, mesmo em minoria, se se dispuser a fazê-lo da maneira mais democrática e menos cómoda, ou seja: negociando.

Quanto ao perigo da direita, é outra chantagem ainda mais patética. O que nos dizem, com efeito, é: "nós somos maus, mas os outros são piores". É verdade que uma vitória do PSD seria má, muito má; mas não tão má que o medo dela me leve a votar PS. Desta vez não escolho o mal menor, até porque a diferença, a existir, é mínima; nem me resigno a que o óptimo seja inimigo do bom ou o mau inimigo do péssimo.

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