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The aim of life is appreciation; there is no sense in not appreciating things; and there is no sense in having more of them if you have less appreciation of them.


..........................................................................................................Gilbert Keith Chesterton
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segunda-feira, 30 de julho de 2007

Novos equilíbrios: algumas sugestões

(Publicado no meu blogue Leviathan, entretanto desactivado, em Julho de 2005, e agora republicado com alterações)

No debate entre os «liberais» e os «estatistas» há muitas vezes uma boa dose de má fé: de um lado há, entre os «liberais», quem queira privatizar ou eliminar as prestações sociais do Estado para fragilizar a posição negocial dos trabalhadores por contra de outrem e assim embaratecer a mão-de-obra; por outro lado há, entre os «estatistas», quem deseje explorar as pesadas estruturas da protecção social em benefício de elites instaladas.

Mas hoje quero pressupor a boa fé no debate. Proponho-me ignorar, sem mais desenvolvimentos, os arguentes de má fé e examinar alguma coisa do muito que de boa fé se tem escrito sobre o assunto.

De um lado argumenta-se, de boa fé, que uma sociedade civilizada não pode tolerar que caia na extrema pobreza quem, por razões que não lhe sejam imputáveis, não tem acesso a um rendimento suficiente. E mesmo nos casos em que a situação de insolvência é imputável ao próprio - por preguiça, incompetência, falta de hábitos de organização pessoal, negligência - não se pode tolerar que dessa insolvência resulte miséria para terceiros, nomeadamente menores dependentes.

Para evitar situações de miséria instituem-se pensões de reforma, subsídios de desemprego, abonos de família, subsídios de doença, baixas médicas, subsídios de reintegração, rendimentos garantidos, subsídios de renda de casa, bonificações de juros, etc. - tudo isto pago pelos contribuintes.

Do outro lado argumenta-se, também de boa-fé: que tudo isto é financeiramente insustentável; que tudo isto é economicamente contraproducente, uma vez que desincentiva o trabalho; e que a partir de certo ponto tudo isto está sujeito à lei dos rendimentos decrescentes, passando a causar um prejuízo superior ao benefício que traz.

Estamos, aparentemente, perante um dilema. Um dilema real no que toca os debatentes de má fé, que nunca se contentarão com menos do que a destruição do Estado Social (uns) ou a sua maximização até ao absurdo (outros). Mas entre os debatentes de boa fé há a possibilidade duma convergência, que não se esgotará no necessário compromisso (entenda-se, meio termo) mas exigirá um esforço de imaginação e estudo que permita determinar quais as prestações que devem ser mantidas, quais as que devem ser modificadas e/ou reduzidas, quais as que devem ser eliminadas e quais as que devem ser criadas.

A protecção social futura (a qual, a existir, pressuporá uma vontade política resultante duma relação de forças) deverá ter como objectivos:

Primeiro, a erradicação da pobreza; segundo, o fortalecimento da posição negocial dos empregados face aos empregadores; terceiro, o incentivo ao trabalho, ao civismo e à iniciativa dos cidadãos. Isto significa que o sistema de protecção social não pode, nem ficar como está, nem evoluir na direcção em que certo poder económico quer que ele evolua.

Resta-lhe evoluir noutra direcção. Qual? Aguardam-se sugestões que partam do princípio que nem a protecção social desincentiva necessariamente o trabalho, nem a eficiência económica exige necessariamente a pauperização de multidões.

As minhas sugestões - tentativas, exemplificativas e provisórias - são estas:

1. Prestações sociais a reformular ou reduzir

1.1. Pensões de reforma:
Princípios aplicáveis: sustentabilidade (o sistema não pode ter despesas superiores às receitas); direito ao ócio (quem já trabalhou deve ter o direito de deixar de trabalhar); e liberdade de decisão (a cada um caberá gerir a idade em que se quer reformar, a duração da carreira contributiva e o montante da pensão).
Qualquer pessoa se poderia reformar com qualquer idade e com qualquer duração de carreira contributiva. A pensão seria calculada segundo uma fórmula em que estes factores seriam determinantes, e que incluiria, além deles, o número de filhos (porque a causa principal da crise do sistema é a baixa natalidade), o estado de saúde (um doente oncológico, por exemplo, tem uma expectativa de vida inferior à duma pessoa saudável, e por isso uma carreira de beneficiário mais curta em relação à carreira contributiva) e as contribuições extraordinárias que tenha feito.
Se deste cálculo resultar, para um pensionista saudável, sem filhos, com 25 anos de idade e com 5 anos de carreira contributiva, uma pensão equivalente a 0,01% do último salário; e para um pensionista doente, com seis filhos, com 75 anos de idade e 55 de carreira contributiva, uma pensão equivalente a 300% do último salário, tudo bem, desde que as contas batam certo.
As pensões teriam de ser acumuláveis entre si e com outros rendimentos. Assim, se o nosso pensionista de vinte e cinco anos arranjasse outro emprego e iniciasse uma segunda carreira contributiva, acumularia pensão e salário; e se ao fim de mais cinco anos se reformasse de novo, e se entretanto tivesse tido gémeos, a sua segunda pensão seria, já não de 0,01% do último salário, mas por exemplo de 0,05% - e acumularia com a primeira.
Finalmente: todos poderiam a qualquer momento «comprar anos» de carreira contributiva ou de idade de reforma - sendo estes, por razões óbvias, mais caros do que aqueles - a um preço tal que não prejudicasse, antes beneficiasse, os outros contribuintes.

1.2. Pensões mínimas, de sobrevivência ou de regimes não-contributivos:
Deveriam ser pagas pelo Orçamento de Estado e não pelo orçamento da Segurança Social. É-me exigível, enquanto cidadão, que participe no esforço financeiro necessário para afastar da miséria os meus concidadãos, mas já não me é exigível que o faça enquanto contribuinte da Segurança Social - especialmente se em consequência a sistema para o qual contribuo vir agravada a sua crise financeira.
Daqui resultariam reduções que, em muitos casos, trariam ainda mais destas pensões para níveis abaixo do limiar de pobreza. A diferença deveria ser suprida através do Rendimento Mínimo Garantido e das novas prestações a criar.

1.3. Abono de família:
Zero para o primeiro filho, nos níveis actuais ou superiores para o segundo, e com um aumento muito substancial para os filhos a partir do terceiro. O montante seria independente do rendimento familiar, para simplificar a burocracia e para evitar as fraudes. A injustiça relativa daqui resultante seria suprida através do imposto sobre o rendimento.

1.4. Rendimento Mínimo Garantido:
Deveria voltar à sua forma inicial de modo a não excluir pessoas que realmente precisam, e ser fiscalizado de modo a não incluir pessoas que não precisam. Eventualmente poderia ser reduzido, tendo em conta as modificações noutras prestações sociais.

2. Prestações a eliminar ou a substituir

2.1. Subsídio de casamento:
Desde logo, o Estado não deveria reconhecer nem homologar «estados civis», mas limitar-se a respeitar, sem qualquer formatação, o direito de cada um a constituir família. O casamento seria uma questão privada, religiosa ou social, mas nunca política ou administrativa. Legalmente, as famílias só teriam existência a partir do nascimento de filhos.

2.2. Subsídio de funeral:
O Estado encarregar-se-ia de enterrar ou cremar os mortos cujas famílias não pudessem ou quisessem fazê-lo. As que quisessem e pudessem pagariam conforme o seu nível de rendimentos e conforme o que tivessem por decente.

2.3. Subsídio periódico de desemprego:
Pelo sistema actual, os beneficiários recebem tanto mais, no cômputo final, quanto mais tempo permanecerem desempregados. É preciso ajudar quem se viu privado do seu rendimento, mormente se descontou para ser ajudado - mas não desta maneira. O subsídio periódico, que incentiva o não-trabalho, devia dar lugar a uma prestação única.

3. Novas prestações:

3.1. Subsídio de desemprego de prestação única:
Ao ficar desempregado o cidadão receberia o seu subsídio todo duma vez. O montante seria calculado de modo a ter em conta a) a duração média das situações de desemprego na faixa etária do cidadão, b) a conveniência de reduzir a despesa nesta rubrica relativamente ao subsídio periódico de desemprego, c) a possibilidade de o cidadão passar a usufruir imediatamente duma pensão de reforma nos termos referidos acima e d) a existência das prestações sociais propostas adiante.

3.2. Dividendo do Cidadão:
Esta prestação, necessariamente de montante modestíssimo, destinar-se-ia a remunerar os cidadãos pelos custos difusos e indetermináveis de toda a actividade económica, que seriam considerados como um investimento de todos e de cada um. Seria igual para todos, variável de ano para ano, e consistiria na distribuição duma pequena percentagem fixa das receitas do IRC e do IVA.

3.3. Salário do Cidadão:
Esta prestação, também de valor modestíssimo, seria financiada por uma pequena percentagem fixa das receitas do IRS e pela totalidade das receitas correspondentes a multas, coimas outros castigos pecuniários pagos ao Estado central pelos particulares ou pelas pessoas colectivas. Destinar-se-ia a remunerar os comportamentos individuais que, sem serem directamente produtivos, contribuem para aumentar a riqueza presente e futura do país: o sustento e educação das crianças, a auto-valorização profissional e cultural, a participação cívica, etc. O montante a receber seria variável de acordo com uma pontuação, e o pagamento seria suspenso por períodos mais ou menos longos a quem fosse condenado por quaisquer delitos ou infracções, tivesse dívidas ao fisco ou se abstivesse nas eleições. A objecção que se pode levantar a esta proposta, nomeadamente a dificuldade em determinar quais os comportamentos sociais que devem ser considerados «produtivos» e remunerados como tais, seria ultrapassada se competisse à Assembleia da República definir estes critérios com uma periodicidade não inferior ao ciclo eleitoral e não múltipla deste (por exemplo, sete anos, visto que o menor múltiplo comum de 7 e 4 é 28).

4. Correcção de desequilíbrios em sede de IRS:
Todas as prestações sociais contariam como rendimentos para efeitos de IRS, que neste sistema teria que ser fortemente progressional.

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