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The aim of life is appreciation; there is no sense in not appreciating things; and there is no sense in having more of them if you have less appreciation of them.


..........................................................................................................Gilbert Keith Chesterton
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domingo, 25 de novembro de 2007

Ser «anti-eduquês» e ser de esquerda

Perguntaram-me há tempos como podia eu subscrever as teses educativas «reaccionárias» de Nuno Crato, Maria Filomena Mónica, Carlos Fiolhais e outros, ao mesmo tempo que critico insistentemente neste blogue a direita neoliberal.

Esta crítica pôs-me a pensar. Estaria eu a ser reaccionário em matéria educativa quando em matéria moral e política sou aquilo que se pode designar por libertário de esquerda? Tanto tempo demorei a pensar nisto que acabei por perder o rasto do meu crítico e agora não lhe posso responder directamente.

Como ponto prévio direi que não sei, nem me interessa, se as pessoas acima mencionadas são «reaccionárias» ou «progressistas». De todos eles, só conheço pessoalmente o Nuno Crato, e mesmo assim superficialmente. De Maria Filomena Mónica, creio ter lido numa entrevista qualquer que não se considera de direita - e o que uma pessoa pensa de si mesma deve, parece-me, ser levado a sério. Carlos Fiolhais defende a racionalidade contra a superstição - e isto, para mim, é uma posição progressista independentemente de quaisquer opções partidárias, que no caso dele não sei quais são.

Mas isto, repito, não vem ao caso. O que vem ao caso é saber quem define e executa as políticas educativas, e no interesse de quem.

Não ignoro que uma certa esquerda tontinha e politicamente correcta tem graves responsabilidades no delírio educativo que rege as políticas do nosso Ministério da Educação; mas daqui a considerar que estas políticas são de esquerda vai um passo que não estou disposto a dar. A esquerda tontinha parece dominar as políticas educativas porque se deixou acantonar nelas, mas quem a pôs de quarentena nas escolas foi a oligarquia, que não é nem ingénua, nem de esquerda. Se as esquerda tontinha não quer exigência no ensino público (porque cria «desigualdades»), a direita oligárquica também não a quer porque cria mecanismos de mobilidade social ascendente; e quem já está no topo não quer competição.

A esquerda quer uma escola que transmita »atitudes» e «valores»; e a direita reaccionária, encantada, concorda entusiasticamente: o que é preciso é que a escola não transmita à plebe ideias perigosas sobre o seu lugar no esquema das coisas, nem conhecimentos que possam ser convertidos em liberdade ou poder.

A sociedade ideal, para mim, seria aquela em que competisse às instituições conservar e às pessoas inovar (o inferno é, muito provavelmente, o inverso). À escola, instituição vocacionada para fazer a ponte entre o passado e o futuro, competiria ser conservadora sem ser totalitária. Mas o que acontece é o contrário: a escola que o poder político nos impõe é totalitária - no sentido em que se arroga o direito de intervir na globalidade da pessoa - mas não procura conservar o património cultural, científico, artístico, literário e simbólico sem o qual nenhuma sociedade pode evoluir ou sequer sobreviver.

De todas as instituições públicas portuguesas, a escola é provavelmente aquela em que se encontrou o modus vivendi mais confortável entre a esquerda inócua e a direita eficaz. Desta promiscuidade resultam, para quem está de fora, três equívocos sobre a actual Ministra: a de que Maria de Lurdes Rodrigues está contra o «eduquês» quando na realidade tem o «eduquês» na massa do sangue; que está com o progresso e com a inovação, quando na realidade está com a encenação vazia destes valores; e que está com a «população» contra os professores, quando na realidade está com a oligarquia contra o ensino.

Que sobre estes equívocos assente ainda hoje uma imagem democrática das escolas é a mais amarga das ironias.

5 comentários:

L. Rodrigues disse...

Excelente reflexão.

Deixo-lhe aqui um link de uma análise do sistema educativo finlandês.
Quando o li, uma das coisas que me saltou à vista é que não há propriamente vanguardismos na sala de aula.

http://www.finland.de/dfgnrw/dfg043a-pisa26a.htm

António Chaves Ferrão disse...

Parabéns por esta oportuna intervenção, e também pelo blog.

Anónimo disse...

Nota máxima!
Quando os historiadores do futuro fizerem a radiografia do presente têm de vir aqui buscar esta chapa.

Nan disse...

É que os vanguardismos na sala de aula não ensinam grande coisa. Digam o que disserem os adeptos de choques tecnológicos, ler, ouvir, falar e escrever ainda são as únicas maneiras de aprender...

SL disse...

Inteiramente, absolutamente, radicalmente de acordo.