...............................................................................................................................................

The aim of life is appreciation; there is no sense in not appreciating things; and there is no sense in having more of them if you have less appreciation of them.


..........................................................................................................Gilbert Keith Chesterton
....................................................................................................................................................

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

A desigualdade é o paraíso?

(Actualizado e corrigido a 13.10.09 às 19:38)

Dos tempos em que entrava em polémicas com os blogues neoliberais, recordo especialmente uma circunstância que, com a repetição, acabou por adquirir o se quê de cómico.
Disposto a admitir, pelo menos como hipótese, que a desigualdade pode ser benéfica porque, aumentando a motivação, aumenta a produção de riqueza, punha-se-me a questão de saber que grau de desigualdade se pode considerar óptimo tendo em conta este benefício.

Fiz esta pergunta centenas de vezes aos nossos neoliberais blogosféricos; e nunca, mas mesmo nunca, obtive uma resposta. Se tivesse perguntado uma vez sem obter resposta, poderia levar este silêncio à conta de o meu interlocutor preferir abordar outros aspectos, que considerasse mais relevantes, do meu comentário; ou se tivesse perguntado algumas vezes obtendo uma ou duas respostas, poderia concluir que os meus interlocutores, considerando embora a questão incómoda, faziam ao menos um esforço para não se furtarem a ela. Ou poderia pensar que, não tendo uma resposta quantificada para me dar, não lhes ocorresse dar-me uma resposta qualitativa, sujeita a um critério plausível.

Mas o carácter sistemático deste silêncio, a absoluta ausência de excepções, permite-me tirar conclusões sobre o que poderia ser a resposta sem fazer processos de intenção e sem recear atribuir a outrem, arbitrariamente, ideias que não são as suas. Estou hoje convicto que há na blogosfera quem acredite que a desigualdade económica é um bem em si mesma, que não há qualquer limite a partir do qual ela se torne contraproducente, e cujo lema não expresso é "quanto mais desigualdade, melhor."

Abandonando, por improdutiva, a tentativa de obter dos neoliberais blogosféricos uma opinião sobre os eventuais limites éticos e práticos da desigualdade económica, comecei a procurar respostas noutras fontes. O princípio de que parti era ético e político e valeu-me várias vezes a acusação de moralista: a desigualdade económica começa a ser inaceitável a partir do ponto em que gera desigualdade política. Posso não ter inveja da fortuna de um Américo Amorim; nem lhe disputo o direito de ter mais poder nas empresas em que tem mais acções do que eu. Disputo-lhe, sim, o excesso de poder numa República em que a sua participação é exactamente igual à minha. Portanto, das duas, uma: ou se consegue eliminar a convertibilidade recíproca entre a riqueza e o poder político - e nenhuma sociedade conseguiu, até hoje, mais que mitigá-la - ou se limita por lei, em nome da igualdade política, o grau de desigualdade económica que uma sociedade democrática pode tolerar sem entrar em colapso.

Tinha, portanto, um argumento ético-político contra os supostos méritos da desigualdade; mas, não sendo economista (e muito menos macroeconomista) não tinha qualquer argumento científico ou técnico. Não estava em condições de contradizer a asserção neoliberal de que a desigualdade resulta necessariamente em mais riqueza e acaba por beneficiar todos, mesmo os que ficam no fundo da escala por um processo de trickle down. Isto cheirava-me a falso, mas uma mera intuição não é argumento contra raciocínios aparentemente escorreitos e aparentemente baseados na realidade das coisas.

Depois descobri na net blogues de economistas que divergem daquilo que eu julgava ser o consenso neoliberal. O primeiro, por ordem cronológica, foi o Ladrões de Bicicletas, que ainda hoje sigo assiduamente. Depois veio O Valor das Ideias, que sigo atentamente apesar (ou por causa) da divergência de opções partidárias que me separa do Carlos Santos. Assinalo, ainda, de entre os blogues portugueses que sigo regularmente, o Da Minha Profunda Ignorância.

Uma característica simpática comum a estes blogues é a ideia que a economia não é assunto só de economistas. Concordo: quem tem alguma coisa a dizer sobre o fato não é só quem o talha, mas também quem o veste.

Da minha ainda mais profunda ignorância, comecei a dar-me conta da existência de estudos segundo os quais a desigualdade económica pode ter efeitos opostos aos que os neoliberais lhe atribuem. Quantos e quais são estes estudos? Quem são os seus autores? Que recepção crítica têm tido? Em que factos se baseiam? Em que medida são validados pela comunidade científica? Estas são as perguntas para as quais comecei a procurar respostas.


No âmbito desta procura, apareceu-me, fortemente recomendado, este livro, que, pela informação que tenho, não só trata em profundidade o assunto que me interessa, como compendia muitos outros estudos efectuados ao longo de décadas. Encomendei-o assim que pude; e, enquanto ele não chega, vou-me entretendo a ler as recensões doutros leitores. Aqui ficam alguns excertos, o primeiro dos quais me foi particularmente penoso ler porque destaca Portugal como um case study em matéria de desigualdade económica.

Simply put, [the authors'] method is to plot the level of health related/social problems against the difference in income of the world's twenty richest countries. Cleverly, this is repeated for each of the fifty United States. Each problem is dealt with separately, the data being represented in graphic form. Wherever there is a large differential betwixt the two ends of the income scale, drug abuse, alcohol abuse, obesity, mental problems, and even teenage pregnancy occur more frequently, people live for a shorter period and commit suicide more regularly. Additionally, but just as damningly, children are not as well educated and less literate . So which countries score well on this scale? Interestingly, if not entirely surprisingly, Scandanavia and Japan have can be seen to have the narrowest of divergence betwixt highest and lowest incomes and, indeed, boast the best psychological health of all. Conversely and rather predictably, those nations with the widest gulf between rich and poor, are thus plagued by the highest occurrence of health-related and social problems. Here's the rub; those countries are, in fact, Britain, the USA and Portugal.

Desta outra recensão, impressionou-me especialmente o facto de os 20% mais pobres entre os suecos terem uma esperança de vida superior à dos 20% mais ricos entre os britânicos, levando-nos a pensar que, exactamente ao contrário do que dizem os neoliberais, a desigualdade prejudica não só os mais pobres, mas a sociedade toda, incluindo os mais ricos:

This is the most important book yet on inequality's effects on society. The authors, Richard Wilkinson (Professor Emeritus at the University of Nottingham Medical School) and Kate Pickett (Senior Lecturer at York University) show how inequality affects the vast majority of the people in every country. They show that the way to deal with society's problems is not to preach at individuals, or to blame young people, parents or teachers. As they write, "The evidence shows that reducing inequality is the best way of improving the quality of the social environment, and so the real quality of life, for all of us." They point out that more equal societies have lower levels of mistrust, illness, status insecurity, violence and other stressors. "Social structures which create relationships based on inequality, inferiority and social exclusion ... inflict a great deal of social pain", worsening all society's problems. Over and again, the USA does worst, and Britain next worst. As they prove, health and social problems are more common in countries with bigger income inequalities. Sweden has lower death rates than England and Wales for working age men and for infants, across all occupational groups. The death rate in its poorest 20 per cent is lower than in our richest 20 per cent! Obesity rates are lower in more equal societies. Women's status and child wellbeing are better in more equal societies, which provide more paid maternity leave. In more equal societies, children experience less bullying, fights and conflict. More equal societies like Finland and Belgium have better educational levels across all social groups than Britain or the USA. Drug use and mental illness are less common in more equal societies; so are teenage births and divorce. More equal countries have shorter working hours. More equal societies also have more social mobility: of eight developed countries, the USA had least social mobility. US bankruptcy rates rose most in those states where inequality had risen most. Less equal societies are more punitive. California has 360 people serving life sentences for shoplifting. In Britain, every day 40 people are sentenced to jail for shoplifting. Countries that spend less on education spend more on prisons. Since 1980, US spending on prisons has risen six times faster than spending on schools. The authors note, "More unequal countries also seem to be more belligerent internationally." If Britain were as equal as Japan, Norway, Sweden or Finland, we would all live a year longer, we would have seven more weeks of holiday every year, mental illness, teenage births, obesity, imprisonment rates and murders would all be halved. The authors conclude, "If you want to know why one country does better or worse than another, the first thing to look at is the extent of inequality. There is not one policy for reducing inequality in health or the educational performance of school children, and another for raising national standards of performance. Reducing inequality is the best way of doing both." How do we achieve this more just society? To their credit, the authors don't suggest by just voting for it, or waiting for the government to do it for us. They write that we must "stand up to the tiny minority of the rich." We need to recruit to our trade unions, because the more trade union members there are, the more equal the society. If we want a better society, we will have to work for it.

Uma nota final: a imagem que apresento no início deste post não é a do livro que encomendei, mas da edição em paperback, que ainda não foi editada. O subtítulo sofreu uma alteração entre as duas edições. Escolhi esta imagem e não a da edição em hardback porque é de melhor qualidade. Em resposta ao primeiro comentário que recebi, acrescentei um link que permite chegar à página relevante da Amazon.co.uk clicando no título deste post.





3 comentários:

Eduardo Miguel Pereira disse...

Olá José Luiz, você deixou-me aqui com água na boca.
Sabe dizer-me onde é que poderei comprar/encomendar este livro ?

JOSÉ LUIZ FERREIRA disse...

Se clicar no meu post, no link "este livro", irá ter à página da Amazon.co.uk referente à edição em hardback. A edição em paperback, mais barata, ainda não saiu mas a Amazon já aceita encomendas.

Recomendo a Amazon.co.uk de preferência à Amazon.com porque os portes são muito mais baratos.

Eduardo Miguel Pereira disse...

Obrigado, esta é uma matéria onde eu gostaria de estar bem melhor informado, e parece-me que este livro servirá na perfeição esse propósito.