Londres: Allen Lane, Penguin Books, 2012
(Citação: p. 231. Tradução minha)
Poderíamos pensar que os que advogam a austeridade tivessem aprendido com a plétora de experiências anteriores em que a austeridade teve consequências desastrosas. A austeridade de Herbert Hoover converteu o crash bolsista de 1929 na Grande Depressão, a austeridade do FMI converteu os resultados negativos no Leste Asiático e na América Latina em recessões e depressões; A austeridade forçada ou auto-imposta em vários países europeus (Reino Unido, Letónia, Grécia, Portugal) está agora a ter exactamente o mesmo efeito. Mas os advogados da austeridade parecem não ser capazes de lidar com esta evidência avassaladora. Como os médicos medievais que acreditavam em sangrar o doente, mas quando os doentes não melhoravam argumentavam que o que eles precisavam era de nova sangria, os sangradores da economia do século XXI não se desviam da linha estabelecida. Exigirão sempre mais austeridade, e encontrarão sempre uma miríade de desculpas para a primeira dose não ter funcionado como previsto. Entretanto, o desemprego continuará a aumentar, os salários continuarão a descer, e os programas públicos em que se apoiam as classes médias e os pobres continuarão a definhar.
Em contraste, a despesa pública tem sido bem sucedida. Em última análise, foram as despesas públicas efectuadas para preparar a II Grande Guerra que puxaram o país para fora da Grande Depressão. Embora o New Deal providenciasse algum estímulo, e e ajudasse a economia a recuperar entre 1933 e 1936, esse estímulo não foi suficiente para compensar o efeito combinado da contracção da despesa a nível local e estadual e da fraqueza do sector agrícola (os rendimentos das pessoas neste sector, que constituíam um quarto da população, caíram dramaticamente neste período - 50% só entre 1929 e 1932). E no fim do primeiro mandato de Roosevelt, em 1936, a preocupação com o défice e as pressões dos conservadores em matéria fiscal induziram-no a cortar nas despesas federais. A recuperação da economia parou e o crescimento tornou-se negativo.
(Joseph E. Stiglitz foi Economista-Chefe do Banco Mundial até 2000. É actualmente Professor na Columbia Business School e preside ao Conselho de Administração do Brooks World Poverty Institute da Universidade de Manchester, no qual desempenha também as funções de director dos programas de Verão para graduados. Ganhou o Prémio Nobel da Economia em 2001 e é o autor dos êxitos de vendas Globalization and Its Discontents, The Roaring Nineties, Making Globalization Work e Freefall.)
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5 comentários:
Também já li. São sempre interessantes as reflexões de Stiglitz sobre as políticas económicas impostas pelas ortodoxias liberais. No entanto, desde a crítica à globalização, passando pelos exuberantes anos noventa, até ao preço da desigualdade há sempre qualquer coisa que fica aquém do que seria necessário para que as coisas pudessem ser realmente diferentes. Por que razão keynes influenciou a marcha da economia de mercado durante décadas e Krugman e Stiglitz não conseguem?
Caro Correia Pinto, creio que os governos só aceitaram Keynes porque foram coagidos a fazê-lo. O problema do Keynesianismo não é não funcionar, é funcionar em benefício das pessoas erradas - ou seja, da maioria. Stiglitz escreve neste livro, a certa altura, que os 1% defendem as políticas austeritárias porque acreditam que elas funcionam em seu benefício, o que pode não ser o caso.
Eu acho que neste ponto Stiglitz incorre na deformação profissional dos economistas e só considera benefício o benefício económico. Os 1% estariam então a tentar maximizar a sua riqueza e os seus rendimentos através duma política que pode ser contraproducente. E depreendo que Stiglitz pensa que os 1% poderiam ser convencidos a mudar de comportamento se lhes fosse demonstrado que poderiam aumentar a sua riqueza e os seus rendimentos pela aplicação de políticas keynesianas.
A minha visão sobre isto é mais negra que a de Stiglitz. Os mais ricos podem não estar tão interessados em maximizar a sua riqueza absoluta, como pressupõe a teoria económica, como em maximizar a sua riqueza relativa. Podem mesmo estar dispostos a empobrecer um pouco para que os 99% empobreçam ainda mais. Afinal, o que dá a umas pessoas poder sobre as outras não é a riqueza absoluta, mas a relativa.
Teoria da conspiração? Talvez. Mas se a maximização das desigualdades fosse um objectivo em si mesma, as políticas económicas em vigor na Europa não seriam diferentes do que são.
E talvez isto possa explicar que a "proibição" do keynesianismo tenha dignidade constitucional na Alemanha, nos tratados europeus, nos estatutos do BCE e em breve também, se a chamada "Regra de Ouro" for avante, na legislação interna portuguesa.
Sim, concordo. Não é conspiração. É um facto. Realmente, se o objectivo fosse o que dizem que não é as políticas, como mto bem diz, não seriam diferentes.
JMCPinto
Caro José Luís Sarmento,
é claro que estamos a ser governados por tipos cuja competência e boas intenções se podem pôr em dúvida. Não tenho dinheiro nem tempo para me ir defender em tribunal de eventuais acusações de difamação, por isso ficamos por aqui.
Agora uma coisa me parece óbvia: nenhum político quer assumir uma política impopular. Mesmo que diga que sim. O PC bem preferiria dar uma de Sócrates. Porque é que não o faz? Porque ninguém nos empresta o dinheiro. Podíamos parar de pagar as dívidas? Claro que sim, mas depois quem é que nos emprestava o dinheiro? Podia-se negociar as condições? Claro que podíamos ter umas condições um pouco melhores. Claro que algumas das condições não tem nada a ver com o pagamento da dívida e são desculpas para nos sugar o tutano.
Mas mesmo um governo de tipos honestos de esquerda teria de nos apertar o cinto, e mito.
Não lhe parece?
A minha saudosa avó, que era uma mulher muito inteligente, apesar de ser de poucas letras, costumava dizer que «aos ricos, não lhes basta ter, é-lhes preciso que os outros não tenham».
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