Blogue sobre livros, discos, revistas e tudo o mais de que me apeteça escrever...
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The aim of life is appreciation; there is no sense in not appreciating things; and there is no sense in having more of them if you have less appreciation of them.
..........................................................................................................Gilbert Keith Chesterton
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terça-feira, 29 de maio de 2012
E assim se vai banalizando o horror e a arrogância
O Washington Post afirma em editorial que, mesmo que as políticas económicas da Alemanha e do BCE estejam tecnicamente erradas, é preciso forçar os eleitores gregos a aceitá-las, sob pena de dar um mau exemplo ao resto da zona euro.
Por quem chora Christine Lagarde?
Christine Lagarde está mais preocupada com as crianças nigerianas do que com as crianças gregas. Isto é o que ela diz, mas mente. A última coisa com que o FMI se preocupa quando intervém num país é o bem-estar das crianças. Preocupa-se, sim, com o pagamento integral das dívidas nacionais - mesmo quando foram contraídas por tiranos corruptos em seu benefício pessoal ou quando as partes credoras nos contratos concederam estes empréstimos sabendo muito bem o que estavam a fazer e conheciam bem os riscos que corriam. Tanto o FMI como o Banco Mundial se opõem terminantemente ao princípio de que as dívidas devem ser pagas por quem as contraiu em benefício próprio. De auditoria à dívida - isto é, do direito elementar de cada um verificar as facturas que lhe são apresentadas - nem querem ouvir falar. De modo que o único país em apuros a fazer uma auditoria oficial à dívida foi a Islândia. Em Portugal, a auditoria está a ser feita, não pelo governo que tinha o dever de a fazer, mas por uma organização da Sociedade Civil ligada aos partidos da esquerda dita "radical". Na Grécia, a intenção por parte do Syriza de pôr em marcha este simples procedimento de rotina, que o FMI devia ser o primeiro a incentivar, vale a uma esquerda que mais não é, em rigor, que coerentemente social-democrata a acusação de "extremista."
Nem interessa ao FMI que os credores saibam onde está o dinheiro que emprestaram, quando é muito mais fácil fazer os pobres pagar. E os pobres que pagam são em grande parte as crianças africanas por quem Lagarde chora as suas lágrimas de crocodilo.
Alguns exemplos que refiro a seguir resumidamente estão desenvolvidos nesta hiperligação. No Gana, a intervenção do FMI reduziu em dois terços o acesso à escola das crianças provenientes dos meios rurais. Na Zâmbia, graças aos cortes impostos pelo FMI nas despesas de saúde, a mortalidade infantil disparou de novo, quando já estava a decrescer. Na Nigéria - sim, na Nigéria - o Programa de Ajustamento Estrutural imposto pelo FMI atingiu de forma especialmente grave os 85% da população que se dedicam à agricultura, tornando mais intensas e frequentes as fomes cíclicas e fazendo piorar os índices, que já eram maus, de subnutrição infantil.
quarta-feira, 23 de maio de 2012
End This Depression Now
As calamidades acontecem - a História está repleta de inundações e fomes, tremores de terra e tsunamis. O que faz esta calamidade tão terrível - o que deve causar a nossa ira - é que nada disto tinha que acontecer. Não houve nenhuma praga de gafanhotos; não perdemos o nosso saber tecnológico; a América e a Europa deviam estar mais ricas, e não mais pobres, do que há cinco anos.
Nem é misteriosa a natureza da catástrofe. Durante a Grande Depressão os políticos tinham uma desculpa: ninguém compreendia realmente o que se estava a passar nem como remediá-lo. Os políticos de hoje não têm essa desculpa. Dispomos dos conhecimentos e dos instrumentos para acabar com este sofrimento.
Só não concordo inteiramente com o Prof. Krugman quanto à inexistência duma praga de gafanhotos. É mesmo de quem não conhece o ministro Vítor Gaspar.
segunda-feira, 7 de maio de 2012
Um tiro no nacional-unanimismo
Paul Krugman pensa que a probabilidade de sobrevivência do Euro e da União Europeia aumentou em consequência das eleições francesas e gregas.
domingo, 6 de maio de 2012
Nova esperança
"Maybe the message that austerity is not only bad economics, but also
bad politics will begin to resonate more here? Let's hope so."
Muitos europeus, eu incluído, pensam que a vitória de Hollande representa uma nova esperança para a Europa. Mas não me tinha ocorrido que pudesse representar também, como pede Mark Thoma neste post, uma nova esperança para os Estados Unidos.
Europeus tomam a Bastilha?
No seu discurso de vitória, Hollande dá subtilmente a entender que talvez não se importasse de assumir a liderança das esquerdas europeias. Na Grécia, os partidos da troika sofrem uma derrota histórica. Na própria Alemanha, Merkel perde mais um dos Länder mais populosos. Estará a Europa a dar um primeiro passo para a tomada da Bastilha?
sábado, 5 de maio de 2012
Na Holanda
A saída do partido xenófobo de Geert Wilders da coligação governamental, por se opor ao Tratado de Estabilidade Europeu, levou a que os partidos do centro austeritário procurassem novas coligações que lhes permitissem prosseguir o processo em curso. O primeiro resultado desta nova coligação foi um anúncio de novas medidas de austeridade anti-laborais, tão brutais como as que estão a ser impostas no Sul da Europa.
Não é fácil sentirmo-nos movidos à solidariedade com os 99% holandeses, que vão sentir na pele o resultado destas políticas. Afinal, se muitos trabalhadores e contribuintes holandeses compraram a narrativa germânica que apresenta "a irresponsabilidade fiscal e a preguiça" dos povos do Sul como as causas da crise e a austeridade como a sua solução, foi porque não se deram ao trabalho de adquirir um mínimo de literacia económica que lhes permitisse pôr em causa a "verdade" oficial. Sentimo-nos tentados a olhar com Schadenfreude para o sofrimento que os holandeses vão suportar. A ideia da justiça poética é sedutora mesmo quando releva da mesquinhez.
A narrativa germânica é, como até alguns economistas neoliberais começam a reconhecer a contra-gosto, pura treta. A crise europeia é, como a americana, uma crise de procura, de más práticas financeiras em detrimento da economia real e de recursos desaproveitados, dos quais a expressão mais visível está nas altas taxas de desemprego. A sua causa não é, nem nunca foi, qualquer espécie de "regabofe" por parte das pessoas comuns ou de outras empresas que não fossem as financeiras. E se o "regabofe" dos governos contribuiu para ela, essa contribuição, além de ser apenas parcial, consistiu sobretudo no corporate welfare que beneficiou e continua a beneficiar as oligarquias.
A solução, consequentemente, está na gestão mais flexível dos défices, na distinção clara entre despesas de consumo e despesas de investimento, no aumento dos investimentos públicos e em políticas de crescimento acordadas a nível europeu, mesmo que exijam alguma flexibilidade na gestão dos défices e da inflação. Tudo isto acompanhado, é claro, duma verdadeira austeridade: a austeridade que combate eficazmente a corrupção e o corporate welfare e separa o poder económico do poder político.
A narrativa austeritária germânica só é possível politicamente porque os eleitores alemães beneficiaram do euro quando ele serviu para financiar o consumo no resto da Europa e continuam a beneficiar dele quando se transforma numa pistola apontada à cabeça dos outros governos e dos outros povos; e só é possível ideologicamente porque a Alemanha perdeu, com a expulsão dos judeus, toda uma elite intelectual da qual poderiam ter saído os economistas de estatura mundial que não tem e tanta falta lhe fazem. A Alemanha, e por arrasto o resto da Europa, está a portugalizar-se. Não reconhece nem valoriza outro pensamento económico que não seja uma espécie de mesquinhez neosalazarista que vê nos equilíbrios contabilísticos, e não no bem-estar das pessoas, o alfa e o ómega das teorias e das práticas económicas.
Não é de esperar que os eleitores holandeses compreendam isto, articulado nestes termos. Mas compreenderão muito bem, como já compreenderam os gregos e os franceses, que a austeridade recessiva é um poço do qual nunca mais será possível sair, e não um túnel com uma luz ao fundo. Que a crise económica europeia, com a "solução" proposta, não é uma crise, mas sim mais um passo num longo processo de decadência histórica. E que esta decadência está longe de ser inevitável.
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