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The aim of life is appreciation; there is no sense in not appreciating things; and there is no sense in having more of them if you have less appreciation of them.


..........................................................................................................Gilbert Keith Chesterton
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quarta-feira, 30 de maio de 2007

Biografia


Não pegues na colher com a mão esquerda.
Não ponhas os cotovelos na mesa.
Dobra bem o guardanapo.
Isso, para começar.

Extraia a raiz quadrada de três mil trezentos e treze.
Onde fica o Tanganica? Em que ano nasceu Cervantes?
Dou-lhe um zero em comportamento se falar com o seu colega.
Isso, para continuar.

Parece-lhe decente que um engenheiro faça versos?
A cultura é um enfeite e o negócio é o negócio.
Se continuas com essa moça fechamos-te a porta.
Isso, para viver.

Não sejas tão louco. Sê educado. Sê correcto.
Não bebas. Não fumes. Não tussas. Não respires.
Ai, sim, não respirar! Dar o não a todos os nãos.
E descansar: morrer.

Gabriel Celaya (1911-1991)

Questões de Moral

Pode-se chamar filho-da-puta ao Senhor Primeiro-Ministro?

Esta questão não pode deixar de se levantar face às recentes notícias segundo as quais um professor de Inglês terá dito a um conhecido «para teres um doutoramento só por fax» (na versão do próprio) ou «estamos num país de bananas governado por um filho-da-puta dum primeiro-ministro» (na versão do bufo que o delatou).

Admitamos, for the sake of argument, que a versão do bufo corresponde ao que na realidade foi dito. Ressalve-se, também, que por economia de espaço não vou aqui tratar da questão sob o ponto de vista das boas-maneiras ou do bom gosto; e que por incompetência também não vou tratar dele sob o ponto de vista da legalidade. Restará então a vertente moral.

Se considerarmos a expressão «filho-da-puta» no seu sentido literal, é evidente que não podemos chamar tal coisa a José Sócrates. Estaríamos a caluniar gravemente uma senhora que, tanto quanto sabemos, não exerce nem nunca exerceu a profissão de trabalhadora do sexo. E estaríamos a considerar José Sócrates um produto dessa actividade socialmente mal-vista - quando é público e notório que nasceu na vigência de um casamento legal, realizado entre duas pessoas de sexo diferente.

Há muito tempo, porém, que a acepção literal desta expressão se tornou arcaica. Em Trás-os-Montes, só para dar um exemplo, quando se chama «filho-da-puta» a alguém, mandam as boas maneiras que se acrescente «sem desfazer na senhora tua mãe, que é uma digníssima pessoa». «Filho-da-puta» será assim sinónimo, não de «bastardo», mas de «sacana» - um indivíduo sem escrúpulos que para atingir os seus objectivos não se importa de sacrificar o bem comum nem de infringir os direitos de quem lhe está mais próximo.

Com o tempo o conceito foi evoluindo no sentido de designar cada vez menos os sacanas em geral e cada vez mais uma categoria específica de sacanas. Para esta evolução muito contribuiu o clássico Discurso Sobre o Filho-da-Puta, de Alberto Pimenta, onde o autor já teoriza, de um modo absolutamente inovador para a época, determinados traços caracterizadores do sujeito. Para este teórico o filho-da-puta é sempre um tipo muito ocupado e também muito preocupado, o que ajuda a explicar a sua quase-obsessão pela eficiência.

Deste modo o «filho-da-puta», que tinha começado por ser um subproduto da indústria mais antiga do mundo, depressa se tornou, primeiro, num fulano sem escrúpulos, depois num sacana qualquer, depois num sacana preocupado e obcecado. Hoje é sobretudo um sacana eficiente, um tecno-burocrata da geração que neste momento está a chegar ao poder nas empresas, no governo e na alta administração.

Antes de responder à minha pergunta inicial tenho, portanto, que considerar vários parâmetros de avaliação. Até que ponto vão os escrúpulos de José Sócrates, ou a falta deles? Já sacaneou muita gente? Nunca sacaneou ninguém? Dá sinais de obsessão? É eficiente? Preocupa-se demasiado com a eficiência dos outros?

Qustões difíceis, estas. Para as esclarecer um pouco, consideremos, como termo de comparação, algumas figuras da cena internacional. Podemos, com rigor, chamar «filho-da-puta» ao Sr. George W. Bush? Estou em crer que não. Podemos chamar-lhe coisas piores, algumas mesmo muito piores, e sem dúvida com toda a justiça. Mas filho-da-puta? A Cheney, talvez. A Rumsfeld, provavelmente. A Wolfowitz, certamente. Mas a Bush falta-lhe a finura, o cool, o je ne sais quoi que definem o verdadeiro (e legítimo, passe o oxímoro) filho-da-puta.

Vladimir Putin anda lá perto, sem dúvida. Jacques Chirac também. Os gémeos Kaczinski, que há poucas décadas poderiam ter sido considerados uns bons filhos-da-puta, são hoje, dada a acepção muito mais exigente do termo, uns filhos-da-puta péssimos. Mas o filho-da-puta por excelência, o pai e a mãe de todos os filhos-da-puta, foi e é - e penso que isto é consensual - o ex-Primeiro-Ministro do Reino Unido, o Sr. Tony Blair.

Ora acontece que Sócrates, por muito que se queira parecer com Blair, não o consegue completamente. Notam-se nele ainda alguns resquícios de consciência moral - que o tempo e o profissionalismo dos assessores se encarregarão, sem dúvida, de apagar; quando olha para os «recursos humanos» com que conta para construir a «modernidade», pode ser que ainda enxergue à transparência, muito difusamente, pessoas. E até o sorriso, calculado ao milímetro como o de Blair, parece por vezes mostrar uma réstea de autenticidade que deve dar noites de insónias aos seus assessores de imagem.

Concluindo: podemos chamar «filho-da-puta» ao Senhor Primeiro-Ministro da República Portuguesa?

A única resposta que cabe aqui é tentativa e provisória. Lá poder, podemos. Mas parece que não devemos, por muito grande que seja a nossa vontade de o fazer - e eu compreendo que essa vontade seja quase irresistível, particularmente por parte de quem se sente sacaneado. Não devemos porque há o risco concreto de sermos processados; e não devemos porque há o risco moral de não estarmos a ser inteiramente justos.

Por mim, já decidi: assim como nunca ninguém me ouviu, também nunca ninguém me ouvirá chamar chamar sacana nem filho-da-puta ao Sr. Primeiro-Ministro actualmente em funções. O que me obriga, por razões de justo equilíbrio, e apesar dos resultados da greve geral de hoje, a também nunca chamar «bananas» à generalidade dos meus concidadãos.

terça-feira, 29 de maio de 2007

Poema para Mariana


És bela no prazer. Leio-te a boca

Escrita entre dois vincos,

O discurso da carne entre silêncios.

O texto e a textura no decurso

Do sexo. Os passos todos.


É dolorosa a via decorrida.

Como não ter no rosto aberta a marca?

Como não ter no olhar impresso o rasto?

Porém és bela, e dóis-me.

O texto é esse, fundamente escrito

Na nossa carne viva. Doloridos

Os corpos, meu amor.


Macerado parêntesis, tão breve

E tão perfeito o dia entre dois traços.

Autor: Vanderdecken
Blog: Rubáiyát

Econtrado no blogue «Reflectindo»

Sinfonia Inacabada de Franz Schubert


Um administrador, adepto de primeira hora da doutrina neoliberal, ganhou um convite para assistir a um concerto da Sinfonia Inacabada de Franz Schubert. Como estivesse impossibilitado de comparecer, deu o convite ao seu gerente de Organização, Sistemas e Métodos.

Na manhã seguinte, o administrador perguntou-lhe se tinha gostado do concerto. Ao invés de comentários sobre o que ouvira e vira recebeu o seguinte relatório:

Circular Interna nº 13/03

De: Gerência de Organização, Sistemas e Métodos
Para: Directoria

Ref: Sinfonia Inacabada

1-Por um período considerável de tempo, os músicos com oboé não tinham nada para fazer. O seu número deveria ser reduzido e o seu trabalho redistribuído pelos restantes membros da orquestra, evitando-se assim estes picos de inactividade;

2-Todos os violinos da primeira secção, doze ao todo, tocavam notas idênticas. Isso parece ser uma duplicação desnecessária de esforços e o número de violinos nessa secção deveria ser drasticamente reduzido.
Se fosse necessário um volume de som alto, isso poderia ser obtido através do uso de um amplificador;

3- Muito esforço foi despendido ao tocarem semitons. Isto parece ser um preciosismo desnecessário e seria recomendável que as notas fossem executadas no tom mais próximo. Se isso fosse feito, poder-se-iam utilizar estagiários em vez de profissionais;

4-Não há utilidade prática em repetir com os metais a mesma passagem já tocada pelas cordas. Se toda esta redundância fosse eliminada, o concerto poderia ser reduzido de duas horas para apenas vinte minutos;

5-Enfim, resumindo as observações dos pontos anteriores, podemos concluir que, se Schubert tivesse dado um pouco de atenção a estes pontos, talvez tivesse tido tempo para acabar a sua Sinfonia Inacabada.

P. G. Wodehouse

A editora Everyman está a publicar todos os romances e contos de Wodehouse, o que me tem permitido obter alguns títulos anteriormente publicados pela Penguin que eu não possuía. Eventualmente poderei ainda substituir alguns paperbacks em pior estado por exemplares mais robustos e de melhor qualidade.
Wodehouse é muitas vezes considerado o maior escritor humorista em língua inglesa no século XX. Não serei eu a quebrar este consenso. Sem Wodehouse não haveria Douglas Adams, Tom Sharpe ou Terry Prachett. As suas personagens, como Jeeves ou Psmith, fazem hoje parte do imaginário de quase todos os seres humanos que têm o inglês como língua materna, mesmo que nunca tenham lido as histórias em que elas figuram.
O que estou a ler dele neste momento é Do Butlers Burgle Banks?, um romance tardio na carreira do autor. Mas sugiro aos principiantes que comecem por Aunts Aren't Gentlemen (um livro de contos), Uncle Fred in the Springtime, Right Ho, Jeeves ou Full Moon.

domingo, 27 de maio de 2007

«Terrorist» de John Updike

Um jovem americano filho de pai egípcio (que não chegou a conhecer) e de mãe irlandesa (que se afastou da igreja católica) descobre no ghetto o islamismo radical e a vocação do martírio.
Como?
Porquê?
Com que olhos é que ele vê o mundo à sua volta - a escola, os colegas, os gangs, os centros comerciais, os namorados da mãe? Como interpreta ele o mundo?