Estou a ler "The Unwinding" de George Parker, em que o autor procura explicar a crescente disfuncionalidade da sociedade americana. O livro deve ter dado uma trabalheira e custado uma fortuna a fazer porque a metodologia do autor consiste em relacionar as biografias de muitas dezenas de pessoas com os desenvolvimentos políticos, económicos, tecológicos e sociais - numa palavra, históricos - entre os anos 60 do século passado e a actualidade.
As personagens são de todas as classes sociais, de todas as religiões ou de religião nenhuma e de todas as origens étnicas e geográficas. As suas opções políticas cobrem todo o espectro americano, desde a direita libertária à ala mais à esquerda do Partido Democrático. Muitas são anónimas, outras são nomes que todos conhecemos, como Jay-Z, Colin Powel ou Elizabeth Warren.
Entre elas conta-se Peter Thiel, o autor da ideia original do Facebook, a quem Mark Zuckerberg se juntou mais tarde. Depois de Zuckerberg comprar a posição de Thiel, este abandonou a empresa e passou a dedicar-se a outros negócios. Não é, como Zuckerberg, o homem mais rico do mundo, mas é mesmo assim fabulosamente rico.
Thiel está convencido que os sistemas político, económico, social e constitucional norte-americanos se tornaram radicalmente disfuncionais a partir de 1973.
«Foi a partir dessa data que os salários começaram a estagnar, a ciência e a tecnologia deixaram de progredir, o modelo de crescimento colapsou, as instituições políticas deixaram de contar com a confiança dos cidadãos e o modo de vida das classes médias começou a fragilizar-se. Durante os anos oitenta esta tendência pareceu inverter-se: foram os anos de Reagan e do optimismo, os anos em que tudo parecia possível. E nos anos noventa a Internet substituiu o Paraíso. Foram feitas enormes fortunas, e a vida sem um computador tornou-se quase inimaginável. No início do século deu-se o crash das dot-com e tudo começou de novo a regredir - a presidência de Bush, o recrudescer da guerra e da violência. Uma economia anémica - excepto em Wall Street - resultou nos eventos sísmicos de 2008 e numa nova depressão. Quatro décadas para baixo, para cima, para cima, para baixo.
Mas a tendência sistémica era para a regressão e para a entropia. Isto não era muito visível no período intermédio entre as duas depressões, e especialmente difícil de ver a partir do Silicon Valley, onde a vida depois do crash das dot-com continuou a correr bem graças sobretudo às redes sociais. Mas trinta milhas mais a Leste a vida não estava a correr bem às pessoas comuns, especialmente nos casos em que o seu único património - a casa onde viviam - tinha perdido metade do seu valor. Thiel começou a olhar para os anos oitenta e noventa como uma espécie de Verão de São Martinho que durou cerca de vinte e cinco anos, começando com o fim da recessão de Reagan em 1982 e acabando com o colapso da habitação em 2007. Mas mesmo durante este Verão de São Martinho as instituições-chave continuaram a desgastar-se, e abundaram as recessões e os pânicos financeiros. Com tantas bolhas - tanta gente a correr atrás de promessas efémeras, todas ao mesmo tempo - era claro que as coisas não estavam, ao nível mais fundamental, a funcionar.
Na Primavera de 2011, Mitt Romney andou pelo Silicon Valley à procura de apoios para a sua candidatura contra Obama, e visitou Thiel na sua casa em S. Francisco para uma conversa ao pequeno-almoço. Thiel ficou muito bem impressionado com ele e deu-lhe um conselho: o candidato mais pessimista sera o vencedor, porque um optimismo excessivo seria interpretado como falta de ligação à vida concreta das pessoas. Por outras palavras, seria um erro para Romney argumentar que Obama era incompetente e tudo se resolveria automaticamente se ele, Romney, fosse presidente. Reagan tinha usado esse argumento contra Carter em 1980, mas em 1980 só 50% dos americanos pensava que a vida dos seus filhos seria mais difícil do que a sua; enquanto em 2011 esta percentagem tinha subido para perto de 80%. A melhor estratégia para Romney seria dizer que as coisas podiam melhorar muito, mas conseguir isso seria extremamente difícil e exigiria mudanças mais profundas do que simplesmente trocar de presidentes. Mas este era um ponto que Romney era incapaz de compreender. Romney partia do princípio que o candidato mais optimista seria sempre o vencedor. Partia do princípio de que as coisas, embora pudessem estar a funcionar mal nos pormenores e à superfície, no fundamental continuavam a funcionar bem.
Por exemplo, estava em curso a era da informação, não estava? Com tudo o que ela prometia, não era? Thiel, um dos pioneiros da era da informação, com a qual tinha enriquecido, já não acreditava nela. Reunido com Romney no Café Venetia em Palo Alto, no lugar exacto em que ele e Elon Musk tinham decidido fazer da Paypal uma empresa cotada em bolsa, a cinco quarteirões dos primeiros escritórios dessa mesma Paypal, que estavam mesmo em frente dos escritórios originais da Facebook e dos escritórios actuais da Palantir, a seis milhas do campus da Google, a menos de uma milha numa direção e a menos de um quarteirão noutra direcção desses templos seculares da nova economia que eram as lojas Apple, no coração do coração do Silicon Valley, rodeado de mesas ocupadas por pessoas magras, saudáveis e vestidas com elegância informal, muitas delas munidas de aparelhos da Apple enquanto discutiam a criação de ideias e os chamados investimentos angélicos, Thiel tirou um iPhone do bolso dos jeans, mostrou-o a Romney e disse que não considerava aquilo um avanço tecnológico de fundo. Comparado com o programa espacial Apollo ou com um jacto supersónico, um smartphone era um brinquedo. Nos quarenta anos anteriores a 1973 tinha havido de facto enormes avanços tecnológicos e os salários tinham sextuplicado. Desde então os americanos tinham-se deixado fascinar por meros gadgets e esquecido quanto custa o verdadeiro progresso.»
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..........................................................................................................Gilbert Keith Chesterton
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