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The aim of life is appreciation; there is no sense in not appreciating things; and there is no sense in having more of them if you have less appreciation of them.


..........................................................................................................Gilbert Keith Chesterton
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quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Reflexões sobre a praia

O corpo humano nu nunca é obsceno, nem sórdido, nem imoral, nem indecente. Tanto faz que seja bonito ou feio, novo ou velho, magro ou gordo, completo ou mutilado: ninguém tem o direito de se sentir ofendido por ele. Esta é a minha primeira premissa.

O que pode ser ofensivo e indecente é a roupa que o cobre: depende da roupa e das circunstâncias. Esta é a minha segunda premissa.

Uma das circunstâncias em que qualquer espécie de vestuário é indecente é a praia, quando estamos nela para apanhar sol e para nos banharmos no mar e tudo na natureza das coisas sugere que fiquemos nus. Os próprios planetas nas suas órbitas, o Sol e a Lua nos seus trajectos, as aves no seu voo, os peixes no mar, a gazela na fuga, o tigre no salto - tudo o que é harmonioso e belo nos pede, implora, exige que fiquemos nus na praia. O Universo bem pode cantar em harmonia, que só nós desafinamos. Os deuses no Olimpo, vendo a figura que fazemos, riem-se perdidamente. E nós, surdos a tudo, à música das esferas, ao riso dos deuses, ajustamos placidamente os fatos de banho.

Num mundo racional e verdadeiramente decente não haveria praias reservadas para nudistas, mas sim praias reservadas para aquelas pobres almas que insistem em vestir-se e infringir assim a mais elementar decência, a mais elementar vergonha, o mais rudimentar sentido do belo. Mas não: o que nos move não é a moral nem a beleza, mas sim a convenção. Mesmo que a convenção seja feia e imoral, ainda assim prevalece. Na rua podemos encontrar alguém com uma peça de roupa que não combine com outra: isso incomoda-nos como uma nota desafinada num concerto de Bach. Pois bem, afirmo aqui que na praia nenhuma peça de roupa combina, ou alguma vez poderá combinar, com o corpo que a suporta.

E assim nos apegamos aos tristes trapos que a convenção nos exige. Por mais reduzidos que sejam, por mais caros, por mais famoso que seja o estilista que os "criou", por mais chique que seja a boutique onde os comprámos, não passam disto mesmo: tristes trapos.

A convenção que no-los impõe rouba-nos a dignidade de que goza qualquer cão rafeiro ou gato vadio. A nobreza dos nossos corpos é profanada pelo lixo que lhes pomos em cima. Chegamos ao ponto de vestir as crianças, sem reflectir que com isto as estamos a erotizar como não faríamos se as deixássemos ficar nuas: eis o que brada aos céus.

Somos na verdade uns bichinhos da terra vis e pequenos. E cegos, e estúpidos: andamos todos de burca e nem notamos.